Tudo o que você queria saber sobre meditação – de A a Zen

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Ansiosos a focados, medrosos a audaciosos, qualquer um pode ter uma prática meditativa para chamar de sua. E o melhor: há comprovações científicas de que exercitar a mente faz bem

Por Nina Rahe

Antes de falar sobre os efeitos benéficos da meditação, o monge Satyanãtha nos lembra que os leitores de hoje certamente já leram mais notícias do que seus avós e já viram mais imagens do que qualquer um dos seus antepassados. Nessa época que ele define como “era da hiperestimulação” – e que na pandemia foi intensificada por um período incalculável diante das telas de computador e celular – uma das formas de manter algum equilíbrio pode ser simples: meditar. “Quando um casamento acaba, como vamos dizer que foi por falta de paz? Um ataque cardíaco, também, pode ser alimentação, genética, uma infinidade de fatores. Mas a falta de paz pode piorar tudo um pouco e sua presença consegue melhorar tudo um pouco”, diz Satyanãtha, nome monástico do brasileiro Davi Murbach, que viveu sete anos em Kauai Aadheenam, um dos mais ortodoxos monastérios indianos.

No campo da ciência, o foco de atenção também se voltou recentemente para os benefícios da meditação na saúde e já são mais de 5 mil pesquisas sobre os impactos da prática nos transtornos e nas doenças. A neurocientista Claudia Feitosa-Santana, fundadora da Neurociência para Desenvolvimento Humano, explica que a evolução de técnicas de mapeamento cerebral, como o aprimoramento de aparelhos de ressonância magnética funcional, permitiu que o nosso cérebro pudesse, enfim, ser analisado. E já há um consenso de que a meditação ajuda, por exemplo, na redução dos sintomas de depressão e de transtornos de ansiedade. Um estudo de pesquisadores brasileiros, desenvolvido em 2012 com grupos de meditadores e não meditadores, demonstrou que os adeptos da prática se mostraram mais eficientes nas tarefas que exigiam grande carga de atenção. Mas os efeitos, segundo a pesquisadora, não serão necessariamente os mesmos para todos que começarem a praticar e dependem muito de atitudes que englobam alimentação saudável, dormir bem e fazer exercício, além da personalidade de cada um.

Monge Satyanãtha || Crédito: Divulgação

QUAL PRÁTICA É A SUA?
Há várias formas de meditar e o mestre Satyanãtha, após viver sete anos em um monastério indiano e ensinar adeptos nos Estados Unidos, na Europa e no Brasil, conhece muito bem quais são elas. A pedido da PODER, ele indica os métodos que podem funcionar mais para cada tipo de perfil. Descubra com qual você se identifica

INCONFORMADOS, SONHADORES E VISIONÁRIOS
Zen é uma palavra que vem do sânscrito e significa meditar. Assim, zazen é nada mais do que sentar-se em zen para atingir o estado de samadhi, no qual não existe separação entre o ser e o objeto e é possível se sentir interconectado com tudo que existe. Na prática, difundida no Brasil pela monja Coen, é preciso se sentar de maneira que a coluna vertebral esteja ereta. As mãos devem ser posicionadas em forma de elipse, representando o cosmos, e os olhos permanecem entreabertos, num ângulo de 45 graus, em períodos que podem chegar a 40 minutos. Durante esse tempo e após três respirações profundas, deve-se respirar de forma natural pelas narinas e observar os movimentos da mente sem tentar controlá-los. Extraordinária para trazer o desapego e reflexão profunda sobre a vida, segundo Satyanãtha, a prática é uma das mais difíceis por se centrar no “pensar em não pensar” e por isso indicada por ele para pessoas que querem revolucionar a própria vida, assumindo novos contextos e prioridades.


FOCADOS, REALIZADORES E AUDACIOSOS

A meditação da linhagem Nãtha é baseada na concepção de que tudo é energia. De acordo com Satyanãtha, praticante dessa vertente, para que o corpo ajude é recomendado fazer exercícios antes de iniciar a meditação, como asanas de ioga, de forma que a coluna não comece a doer e a concentração não se perca. A indicação é fechar os olhos, se sentar no chão com as pernas cruzadas – ou em uma cadeira com os pés se conectando ao chão – para focalizar na existência interna. A cabeça e o tronco devem se equilibrar em uma posição confortável e as mãos repousam no colo, a direita sobre a esquerda, ou se mantêm apoiadas sobre cada joelho, com a palma virada para cima e o indicador segurando o dedão. A investigação das energias pode começar pela percepção do calor do corpo até atingir sentimentos, com o propósito de organizá-los e transformá-los, aumentando a coragem e diminuindo a tristeza, por exemplo.

INQUIETOS, ACELERADOS E ANSIOSOS
De acordo com Satyanãtha, a maneira mais acessível para meditar é o mindfulness. “Quem acha difícil e tem dificuldade de controlar a mente, é uma porta de entrada para a meditação, tão discreta que pode ir ao trabalho junto com você”, diz o monge. A prática, como define o médico e especialista na área Marcelo Demarzo, é um dos estados naturais da nossa mente (a atenção plena) e consiste em uma abordagem laica da meditação. Assim, o mindfulness utiliza as técnicas meditativas como treino para obter um estado de atenção. Uma das formas mais simples para começar é a prática dos três passos, que seriam adotar uma posição confortável e se centrar nas sensações físicas, como o contato do corpo com o chão ou cadeira, e nos pensamentos sobre essa experiência; concentrar o foco nos movimentos de respiração; e, por fim, retornar a atenção para o corpo e o ambiente, percebendo também os sons e a temperatura do local. “De maneira ‘informal’, a prática também pode ser utilizada intencionalmente nas atividades do dia a dia, como durante as refeições ou em reuniões de trabalho”, diz Demarzo.

INCONSTANTES, INSEGUROS E MEDROSOS
O pranayama, utilizado em práticas com foco na respiração, é, segundo Satyanãtha, útil para quem tem medo e pouca autoconfiança. A técnica, presente na meditação Nãtha e no Yoga Sutra, deve ser realizada com a passagem do ar pelas narinas, utilizando o diafragma. A ideia é manter o peito estático na maior parte do tempo e sentir a barriga se movendo. “São práticas muito interessantes para criar o hábito de meditação”, conclui o monge.

CALMOS E PERSEVERANTES
Para quem busca harmonia e estabilidade, a indicação são os mantras. A palavra significa em sânscrito “som sagrado”. Trata-se de uma sonoridade que tem como objetivo lembrar algo que seja importante, o que pode consistir tanto em um monossílabo, como o Om, uma frase curta ou uma estrofe de 24 sílabas, o caso do Gayatri mantra. “Você pode escolher um que tenha significado para você e, ao ouvir sua repetição, sentirá a vibração, deixando que cresça e reverbere”, explica Satyanãtha. “Só recomendo para quem já tenha calma”, diz.

GUIA DE BOLSO
Praticante de meditação, Christian Gebara, CEO da Vivo, é quem está por trás da iniciativa da empresa de lançar um aplicativo voltado à prática. O Vivo Meditação, gratuito para os colaboradores e clientes da companhia (para outras pessoas, o valor é R$ 15,99 por mês), reúne opções para meditar com duração entre cinco e 50 minutos. Baseadas na técnica Nãtha, as gravações são voltadas para diferentes objetivos, como “dormir melhor”, “aumentar o foco” e “melhorar a autoestima”. Para desenvolver o projeto, o monge Satyanãtha conta que meditou entre sete e dez vez ao dia durante cerca de quatro meses. “Não conseguia apenas falar, precisava meditar junto”, explica – ao todo, ele gravou 1.007 meditações guiadas. “Fui pegando o catálogo do monastério e adaptando para uma linguagem mais acessível.” De acordo com Rodrigo Gruner, diretor de Serviços Digitais e Inovação da Vivo, nos primeiros meses de isolamento social, de março a junho de 2020, o número de usuários do aplicativo registrou aumento de 124% em relação ao mesmo período no ano passado e a quantidade de downloads quase triplicou, com um crescimento de 183%.