POR CAROLINE MARINO
N o mundo hiperconectado em que vivemos, as informações vêm de todos os lugares – WhatsApp, apps, televisão, e-mail, o diabo. Uma estimativa, feita pela Universidade da Califórnia-San Diego de 2019, apontava que as pessoas são bombardeadas diariamente com o equivalente a 35 GB de informações, uma quantidade suficiente para sobrecarregar um computador em uma semana. No entanto, segundo dados de outra universidade, a de Berna, na Suíça, as pessoas conseguem ler, no máximo, em torno de 350 páginas por dia – o equivalente a 590 KB. “Vivemos uma fase desafiadora, com acesso a dados o tempo todo. Em um mesmo dia, você assiste a um vídeo, ouve um podcast e lê reportagens, material que poderia servir de inspiração para o desenvolvimento de um projeto, por exemplo, mas não é possível memorizar as partes de que precisa por conta do volume”, diz Valéria Oliveira, consultora da escola de negócios HSM, e especialista em temas comportamentais. Ou seja, o que acontece é que você se esforça para lembrar a ideia por trás de um artigo que leu recentemente e perde tempo procurando onde salvou o vídeo que seria importante para uma apresentação.
‘‘Num mundo em que somos desafiados a inovar, saber que temos a informação registrada traz segurança e diminui a ansiedade” Valéria Oliveira, consultora da HSM
Como, então, absorver tanto conhecimento e conseguir usá-lo para produzir melhor, ter insights e não ficar à deriva? Tiago Forte, brasileiro radicado nos Estados Unidos especializado em produtividade, autor de Building a Second Brain: A Proven Method to Organize Your Digital Life and Unlock Your Creative Potential (Construindo um Segundo Cérebro: Um Método Comprovado para Organizar Sua Vida Digital e Desbloquear Seu Potencial Criativo, em tradução livre), crê ter uma solução. Ele sugere usar o aplicativo de notas do seu celular e, a partir daí, aperfeiçoar o sistema com o uso de outros recursos. É isso mesmo que você leu: Tiago fala em “segundo cérebro”. A ideia é simples, de acordo com ele. Basta pensar em um caderno, daqueles simples, que você usava na escola, para anotar ideias, ansiedades e reflexões sobre a vida. Pegue esse caderno e expanda seu uso para desenhar projetos e metas. “Nossa memória é limitada, e o segundo cérebro vem justamente para nos ajudar por meio dessas anotações”, explica.
A etapa seguinte é digital. “Seu celular, tablet ou computador podem guardar links, citações, PDFs, livros. Com isso, você consegue criar o melhor segundo cérebro possível”, conta. Para ele, construir esse aparato é registrar 10% de uma ideia que parece aproveitável para usar no futuro. “Fazendo isso por mais de dez anos, guardando uma ou duas notas por dia, você vai ter criado mais de 600 pedaços de conhecimento útil”, afirma. Ele sugere alguns apps, como Evernote, Craft Google Keep e Simplenote. E, para auxiliar nesse processo, desenvolveu o que chamou de metodologia Code, processo criativo de fazer anotações e usá-las para produzir novos trabalhos ou para subsidiar a tomada de decisões
MAIS PRODUTIVIDADE E IDEIAS
Na visão de Cinthia Alves, psicóloga especializada em desenvolvimento humano e mudança de comportamento, a experiência de registrar e, assim, prestar mais atenção às notas feitas, aumenta o nível de consciência e, consequentemente, a intencionalidade para as ações e para o melhor uso do tempo. Isso porque a neurociência já identificou que a mente tem um gasto calórico significativo toda vez que tem algo novo para lidar. Assim, identifica de forma automática quais comportamentos atendem às nossas necessidades e fazem deles hábitos. E isso pode ser um problema. “Nossos hábitos, por mais funcionais que sejam, nem sempre são saudáveis e podem não ser a única forma de resolver nossas demandas. Se não estivermos atentos para questionar o porquê fazemos as coisas – e, mais ainda, como fazemos –, corremos o risco de ficar apenas no piloto automático, restringindo nosso campo de experiência e aprendizagem ao que já funcionou algum dia”, revela.
‘‘Nossos hábitos nem sempre são saudáveis. Se não estivermos atentos para questionar o porquê fazemos as coisas, corremos o risco de ficar apenas no piloto automático” Cinthia Alves, psicóloga
Além disso, Cinthia explica que a memória é afetiva, engenhosa estratégia de sobrevivência para que não fiquemos paralisados por conta de traumas do passado, e, com isso, para armazenar alguma nova informação ou registrar sensações, é fundamental estar com atenção plena no que se está vivendo. “Quanto mais recursos utilizarmos para educar nossa mente para o direcionamento do foco, mais memória disponível teremos”, informa.
Os benefícios do método são muitos. A partir do momento que você consegue organizar as informações, aumenta seu repertório e consegue trabalhar com mais criatividade e foco. “Num mundo em que somos desafiados a inovar, saber que temos a informação registrada quando precisarmos dela traz segurança e diminui a ansiedade”, diz Valéria, da HSM. Isso sem falar que, com mais conhecimento, você tem uma visão ampla e consegue com facilidade pensar em soluções e contribuir com seus circunstantes.
MENTE ORGANIZADA
As quatro etapas do método desenvolvido peloespecialista Tiago ForteCAPTURAR
A primeira etapa é sim – ples: escrever tudo aqui – lo que achar interessante. Quando a informação está apenas em sua cabeça ou lá fora, vagando pelo mundo, o conteúdo ainda não é seu. Você tem de capturá-la e in – seri-la em seu “laboratório” particular. Ou seja, não so – mente memorize aquilo que o interessou, registre.
ORGANIZAR
Agora é necessário estru – turar um sistema para guar – dar as informações. Tiago Forte recomenda organizar suas notas em torno de pro – jetos e metas. “Muitas pes – soas gostam de criar catego – rias, como negócios, ideias, marketing, mas isso pode até servir para uma biblio – teca, mas não para sua vida pessoal”, diz. Segundo ele, o ideal é criar uma pasta para cada projeto ou meta, e inse – rir as informações ali.
DESTILAR (OU REFINAR)
Hora de usar a tesoura. Ao captar informações de um li – vro, talvez só cinco ou dez fra – ses sejam realmente importan – tes. Tiago sugere uma pergunta para ajudar nesse processo: “Quais ações e conclusões vo – cê quer tirar desse conteúdo para colocar na sua vida?”.
EXPRESSAR
O objetivo de fazer anota – ções não é apenas registrar in – formações de um certo modo é, na verdade, ter uma ferra – mentea de expressão – a expres – são de sua voz, de sua história, de sua mensagem, de sua experiência. “O segundo cérebro existe para você se expressar melhor. Significa ter mais maté – ria-prima e fontes”, explica o es – pecialista. Para Tiago Forte, essa etapa se assemelha a juntar pe – ças de Lego para ter algo maior, novas ideias para se comunicar bem. “Tudo isso serve para me – lhorar nossa comunicação e nos tornar mais eficazes e criativos.”