RESPIRO DA FLORESTA

Flávio de Meira Penna || Crédito: Fernando Torres

Projeto da ASF Brazil, a Amazon Sustainable Forestry, gera renda local com manejo sustentável de madeira no Acre e refloresta a Amazônia

Por Denise Meira do Amaral
Foto Fernando Torres

Aos 65 anos, Flávio de Meira Penna gera curiosidade ao falar sobre seu projeto que prevê o reflorestamento para daqui a duas décadas. Como sua mãe viveu até os 101 anos, e o pai, até os 100, ele aposta na herança da longevidade e brinca não planejar partir tão cedo: “Não estou plantando para colher somente daqui a 20 anos, mas para o segundo ciclo da madeira, daqui a 40 anos”, programa o sócio-proprietário e fundador da ASF Brazil, a Amazon Sustainable Forestry. 

Filho de pai escritor e diplomata, José Osvaldo de Meira Penna, Flávio nasceu em Nova York, morou na Suíça, na Nigéria, em Israel e na Noruega, até se fixar no Rio de Janeiro, onde estudou administração de empresas na FGV, e posteriormente, fez um MBA em Harvard. Foi no sítio da família em Petrópolis, na serra fluminense, que sua paixão pela natureza aflorou. Ainda sem energia elétrica e com uma trilha de 1 quilômetro para se chegar até a casa, Flávio relembra com nostalgia os banhos de rio e as andanças pelo mato. 

Após engajar-se em diversas instituições como The Nature Conservancy, Mac Arthur Foundation e Conservation International, atuando na área de captação de recursos para projetos, e trabalhar como consultor administrativo para empresas, Flávio resolveu apostar no seu grande projeto de vida. Em 2016, criou a ASF Brazil após percorrer o Norte do país e se deparar com cenas de devastação ambiental e notar que a comunidade local não era incentivada economicamente a preservar a floresta.

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“Hoje a conservação da Amazônia é uma preocupação não só nossa, mas do mundo. E como se preserva a floresta? Não adianta deixá-la intocada, porque vai aparecer grileiro e madeireiro ilegal. É preciso engajar as comunidades ao redor no manejo sustentável, prevenindo ainda o desmatamento”, explica Flávio. Segundo ele, um bom exemplo é o Projeto Tamar, em que a maioria dos funcionários eram os próprios expescadores das tartarugas, que tiveram sua renda revertida para a preservação das espécies e com o turismo. 

De acordo com a o relatório “Florestas: no centro de uma recuperação verde da pandemia Covid-19”, da ONU, o manejo florestal sustentável, ou seja, explorar de forma controlada a floresta com o mínimo impacto ambiental possível, é um meio eficaz para tirar milhões da pobreza e construir economias e sociedades resilientes que podem resistir a pandemias, mudanças climáticas e outros desafios globais.

‘Com uma atividade economicamente viável, você transforma o predador em protetor” – Flávio de Meira Penna, sócio-proprietário e fundador da ASF Brazil

Infelizmente, a atividade econômica do momento – e que acaba com a floresta – é o gado. Mas se mostrarmos que é possível preservar gerando receita de forma sustentável, como o manejo de madeira certificada, turismo, ou extração de produtos locais como a castanha, por exemplo, você não precisa mais do boi”, acredita.

Com a premissa de retirar da floresta somente o que ela pode regenerar, a ASF Brazil atua no mercado extraindo cerca de 15 m³ de madeira por hectare de suas terras – a lei permite hoje até 30 m³ por hectare. O plano de manejo da companhia prevê o inventário de todas as árvores, individualmente numeradas e catalogadas e com a sua localização de GPS, em uma área florestal de mais de 40 mil hectares na região de Rio Branco e Xapuri, no Acre. 

“Isso significa tirar uma árvore aqui, e outra acolá, mas não sem antes passar pela aprovação das autoridades ambientais, que vão verificar se aquela espécie pode ser cortada naquela região ou não”, explica Flávio. Ele ainda relembra que o tão aclamado blockchain já é realidade no manejo sustentável, já que toda a cadeia do produto pode ser facilmente rastreada de forma digital desde o início do processo. 

Com 80% das propriedades da ASF Brazil dedicadas à colheita sustentável e 20% com ações de reflorestamento de espécies exóticas de alto valor de mercado, Flávio conta que o investimento é altamente atrativo para ativos a longo prazo: “Se plantarmos um hectare de Teca, por exemplo, com cerca de US$ 2 mil o hectare, daqui a 20 anos essa madeira vai valer em torno de US$ 60 mil a US$ 80 mil. E durante esses 20 anos o investidor pode ainda gerar receita com o processamento da madeira, gerando caixa imediatamente”. 

Crédito: Getty Images
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A companhia processa madeira de lei para a produção de pisos, decks e portas, além de compensados de madeira branca. Os produtos seguem majoritariamente para o mercado europeu, asiático e norte-americano, já que, segundo Flávio, são os mais preocupados com o uso de madeira legal e certificada. “São muito rigorosos e para nós isso é ótimo porque gera pressão nos madeireiros ilegais. Essas marcas não querem seus nomes envolvidos em manchetes sobre a destruição da Amazônia.” Com a pandemia e o fechamento de várias fábricas de madeira na Ásia, a ASF Brazil viu a procura pelo material aumentar exponencialmente.

A companhia conta com mais de 400 funcionários, o que a torna um dos principais empregadores privados do Acre. Tanto no manejo das florestas quanto nas áreas de produção, as equipes são altamente engajadas, e não apenas pela questão econômica, mas também pelo propósito do projeto. À medida que expandir as operações para regiões mais remotas da Amazônia, a ASF Brazil espera impactar a vida de 20 mil pessoas.

INVESTIDORES

Em um primeiro momento, o perfil do investidor buscado pela companhia são as family offices, preocupadas em capitalizar negócios que adotem práticas ambientais, sociais e de governança, além de fundos e investidores institucionais que considerem aplicar recursos em projetos com retorno de médio a longo prazo. A Solstic Advisors, boutique especializada em fusões e aquisições (M&A) e captação de recursos é a assessora financeira responsável por atrair potenciais investidores, em acordo firmado recentemente.

Em vez de fazer uma simples doação para a Amazônia, o investidor que entrar com a gente irá preservar a floresta e ainda obter retorno financeiro de um investimento como qualquer outro. Essa junção de elementos, somados ao fato de termos a melhor madeira natural do mundo, torna o nosso negócio particularmente atraente”, acredita o fundador da ASF Brazil, que dobra de tamanho a cada ano.