Por Anderson Antunes
Em uma época em que muitas profissões estão simplesmente sumindo do mapa e pessoas ao redor do mundo são forçadas a repensar suas carreiras, a americana Amy Webb reina absoluta como um norte para aqueles que simplesmente não sabem o que o futuro lhes trará. Sua profissão, aliás, é relativamente antiga: como futurista, um termo usado para definir os profissionais cuja principal função é ponderar sobre o dia de amanhã e visto pela primeira vez em 1842 no dicionário de inglês Oxford, Amy não escolheu ganhar seu pão fazendo algo novo. Mas ela nunca esteve tão em alta, ao mesmo tempo em que a conjuntura atual se mos- tra a mais complexa quando comparada aos outros momentos dos últimos quase 180 anos nos quais os futuristas foram tão ouvidos quanto os religiosos.
Nascida em East Chicago, uma cidadezinha com menos de 30 mil habitantes onde o futuro parece teimar em chegar, Amy se interessou pela música na adolescência e chegou a estudar clarinete na prestigiada Jacobs School of Music, fundada em 1921, em Indiana. Sua curiosidade em relação a temas, digamos, mais com- plicados, acabou a tornando uma estudante de ciências políticas e econômicas na Indiana University Bloomington, onde ela se formou em 1997. O curso tinha um diferencial, que no caso era uma especialização em teoria dos jogos que definitivamente mudou a visão de mundo de Amy.
Depois de algumas passagens pelas redações de grandes jornais como o The Wall Street Journal, para os quais escrevia artigos sobre quase tudo, mas sempre pensando lá na frente, fundou, em 2006, o Future Today Institute, uma empresa de consultoria cujos serviços prestados incluem até mesmo a previsão de quais segmentos de cada indústria sobreviverão às mudanças do cotidiano em períodos que podem somar 30 anos. De certa forma, Amy “joga” com suas previsões para atender sua clientela, que aliás a adora e, claro, não pensa duas vezes para desembolsar os milhões de dólares que ela cobra.
Considerada uma das mulheres mais importantes e in- fluentes da atualidade, a futurista também já atuou como consultora do gigante de streaming americano Hulu (a série The First, sobre uma fictícia e inaugural missão humana para Marte nos anos 2030, tem o dedo dela) e hoje em dia sem- pre é chamada para os grandes painéis nos quais os assuntos discutidos em geral têm a ver com a nova realidade humana pós-pandemia de Covid-19.
Sobre isso, por sinal, vê mais oportunidades do que desafios. “O momento para as grandes marcas e empresas se reposicionarem no mercado é agora”, Amy disse em uma live ainda no comecinho da pandemia. Redefinir estratégias e, principalmente, prestar atenção nas novas tendências também são duas coisas que ela recomenda nesses encontros nos quais é ouvida com interesse especial.
Como na última edição do South by Southwest (SXSW), em março. Amy apresentou dois tipos de cenário de futuro: o catastrófico e o transformador. No primeiro, em algumas décadas não existirão mais consultas médicas como conhecemos: seu corpo será monitorado 24 horas, em tempo real, por implantes e dispositivos inteligentes; planos de saúde poderão monitorar seus hábitos e, a partir deles, definir o custo do pacote; e de olho na produtividade, camas inteligentes impedirão a soneca da tarde aumentando a temperatura do colchão. Já no cenário transformador, e mais plausível, as grandes organizações tomarão decisões com base em modelos analíticos que apontem para o futuro e, com base neles, produtos e serviços serão lançados mediante análise de impacto social a longo prazo. “Este momento de transformação é sobre você”, disse Amy. “Imagine você no futuro, mesmo que ele te assuste. Tomar ação sobre esse futuro é um ato radical.”
Ela é autora de vários livros, seu mais famoso é Data, A Love Story, publicado em 2013. A obra foi baseada em sua própria experiência nos aplicativos de namoro, mas sempre sob seu olhar analítico e com muito de sua paixão pelos números e estatísticas e dicas suas sobre como viver o agora, o que em seu caso pode até soar como uma contradição. O resultado foi considerado “criativo e inventivo” pela Booklist, publicação da Associação dos Bibliotecários Americanos, e resultou em 7 milhões de cópias vendidas.
Amy também tem chamado atenção pelas críticas cada vez mais fortes que faz ao grupo de empresas de tecnologia que classifica como G-MAFIA, em alusão às americanas Alphabet (Google), Microsoft, Amazon, Facebook, IBM e Apple, além das chinesas Baidu, Alibaba e Tencent. Todas, segundo a expert, têm em suas mãos basicamente o futuro da inteligência artificial, que por sua vez é o que ela acredita também ser o futuro da humanidade. Se não nos cuidarmos e adotarmos uma postura de maior cobrança na hora de lidar com essas megacorporações, podemos ter um futuro ainda mais sombrio do que a atual realidade possa parecer, segundo Amy, que não fala nada sem antes saber bem o que está dizendo e não costuma errar muito quando faz uma previsão.
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TRÊS TENDÊNCIAS QUE IRÃO MOLDAR O FUTURO DA COMUNICAÇÃO
1. O fim da medição de popularidade virtual por métricas de atenção
Atualmente, todos aqueles com uma considerável presença on-line, sejam grandes marcas ou indivíduos de certa fama, controlam seu próprio “ibope” usando os algoritmos que lhes traduzem quem é o seu público. O problema é que muito desse movimento é feito por bots e robôs. No futuro, garante Amy, anunciantes e produtores de conteúdo serão forçados a desenvolver novas tecnologias para tornar essa visão menos deturpada.2. Os deepfakes vieram para ficar
Os novos aplicativos que permitem mesclar áudios e vídeos “fakes” com imagens de pessoas reais, apesar de aparente- mente inofensivos, estão cada vez mais presentes nas redes sociais e não deverão sumir de cena tão cedo. Para Amy, isso significa um avanço da inteligência artificial, que aos poucos vai definindo essa nova interação entre homem e máquina. Traduzindo: novos personagens e, quem sabe, até novas celebridades virtuais terão cada vez mais espaço no futuro. Se isso é algo bom ou ruim, só mesmo o tempo dirá.3. #Fiqueemcasa e surja como um holograma por aí
Sim, as gravações de campo de luz que eram sinônimo de tecnologia uns dez anos atrás voltarão com tudo, ainda mais nestes tempos de pandemia. Com as pessoas trancadas em casa para se protegerem, uma forma de compensar essa ausência seria reproduzindo as imagens delas com luz, tal como era moda nos filmes de ficção científica dos anos 1990. A novidade ficará por conta da combinação desses hologramas com outras formas de mídia sintética já existentes, a fim de dar um ar de maior realidade ao que refletem.