As escolhas do escritor, ambientalista e líder indígena Ailton Krenak

Eleito o intelectual do ano pelo prêmio Juca Pato concedido pela União Brasileira de Escritores (UBE), o líder indígena mineiro foi responsável por incluir o capítulo sobre os direitos dos povos indígenas na Constituição de 1988, além de ser reconhecido por seu trabalho como ambientalista. É autor de livros como Ideias para Adiar o Fim do Mundo, O Amanhã Não Está à Venda e A Vida Não É Útil, todos lançados pela Companhia das Letras

Ailton Krenak || Crédito: Divulgação

Por Fernada Grilo

COMO TER UMA VIDA ÚTIL?
Não devemos tornar a vida algo utilitário, ela é bênção, dom, vale dançar a vida, ela é feita para dançar.

O FIM DO MUNDO ESTÁ PERTO?
Não, na verdade o mundo não tem fim, nós temos fim.

COMO PRESERVAR A CULTURA INDÍGENA?
Respeitando a diversidade de seres, e os índios estão entre eles. Se a gente respeitar negros, brancos, passarinhos, borboletas, estamos fazendo bem.

O QUE FALTA PARA ENTENDER A GRAVIDADE DA DESTRUIÇÃO DO MEIO AMBIENTE? Falta amor.

COMO SOBREVIVER À PANDEMIA? Estou me escondendo na beira do rio Doce, na laje do rio, que passa aqui na aldeia.

A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988 É… Um sonho social. Não se realizou, como todo sonho social, que ao entrar em contato com a realidade o pau quebra.

MAIOR HERANÇA INDÍGENA PARA O MUNDO: Eles mesmos.

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MAIOR DESAFIO DA VIDA: Ficar vivo.

MOMENTO DE MAU HUMOR: Fico apavorado quando marcam algo depois das 20h, é ruim para gravar, pensar, falar. Para mim, depois dessa hora é uma canseira.

ESCRITOR: Tudo o que Graciliano Ramos escreveu, até o terrível Memórias do Cárcere, que mostra o pior período da ditadura.

FRASE PREFERIDA: “Deus é grande, Alá é imensurável.”

SONHO DE INFÂNCIA: Sonhava que estava na trilha e quando chegava ao topo eu voava. Olha que nem conhecia o Batman e o Super-Homem.

FRUSTRAÇÃO: Parar de sonhar que voava depois dos 12 anos.

PEÇA DE ROUPA: Gosto muito de camiseta, uso até quando deveria estar de camisa.

UM LIVRO: Tenho 800 livros na prateleira, se falar um estou discriminando os outros. Poderia falar Torto Arado, do Itamar Vieira Junior, assim como Graciliano [Ramos] e Guimarães [Rosa]. Eles fazem o artesanato de letras.

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TALENTO QUE NINGUÉM CONHECE?
Plantar batata, banana e pé de manga haden na aldeia. Deu tanto que os galhos estão caindo, vou ter que suspender.

PECADO GASTRONÔMICO: Açúcar. Agora, por exemplo, tem manga madura e tenho que me conter para não comer toda hora.

LUGAR PREFERIDO NO MUNDO: Onde estou agora (tribo krenak, às margens do rio Doce, em MG). Do ponto de vista ambiental, esse é o pior lugar do rio Doce, por causa da tragédia em Mariana, então era para estar mal humorado. Mas esse pior era o melhor.

Vale Rio Doce || Crédito: Reprodução

O QUE MINAS GERAIS TEM DE MELHOR? O Drummond [Carlos Drummond de Andrade].

ARTISTA QUE MAIS GOSTA: Os que tecem uma trama, um balaio, constroem uma flecha. Os colegas da exposição Véxoa, na Pinacoteca de SP, e a mostra da Daiara Tukano, no CCSP.

Crédito: Reprodução

MEDO: Eu devo de ter escondido ele em algum lugar.

MANIA: De querer limpar os lugares. Se me der carona no carro e tiver um saquinho vou recolher para jogar fora. Lata de cerveja no bolso eu acho o fim da picada.

QUEM TE INSPIRA: Minha mãe Luci, de 89 anos. Ela me fez acreditar que a vida é uma bênção, que a gente pode se expandir… Minha “Luci in the Sky”.

COM O QUE SE PREOCUPA: É indecente dizer que não me preocupo com nada, e também não ia explicar se me preocupo com tudo. Se viver cada dia não tem com o que se preocupar.

O MUNDO ESTÁ CHATO? Não, está cada vez mais redondo, ao contrário do que algumas más línguas falam.

COMO ENCONTRAR A PAZ? O Arnaldo Antunes escreveu “as coisas não têm paz”. Concordo, paz está nas pessoas, o Gandhi andava na confusão da Índia e refletia o tempo inteiro sobre a paz.

Mohandas Karamchand Gandhi || Crédito: Getty Images

SER BEM-SUCEDIDO É: Um pescador que pega o que come, vai e volta todos os dias. É quem cabe nele mesmo, não precisa dominar nada.

O QUE FALTA REALIZAR: Escrever poesia.

DESEJO PARA O FUTURO…
Não sei se vai sobrar algum desejo porque consumo (esse desejo) todo o dia.