O Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta quarta-feira (25) o julgamento de dois recursos que abordam se, por convicções religiosas, as Testemunhas de Jeová podem solicitar ao governo o financiamento de um tratamento médico específico ou exigir que suas cirurgias sejam realizadas sem transfusões de sangue. A Corte está a um voto de formar a maioria para reconhecer que a recusa do tratamento com sangue de terceiros é legítima para aqueles que seguem a religião. Na semana passada, cinco ministros já se manifestaram a favor dessa perspectiva.
O julgamento será retomado com o voto do ministro Nunes Marques. O debate envolve direitos fundamentais garantidos pela Constituição, como saúde, dignidade da pessoa humana, legalidade, e liberdade de consciência e crença. Atualmente, as Testemunhas de Jeová, que somam mais de 900 mil adeptos no Brasil, não aceitam receber transfusões de sangue.
O que o STF discute
De acordo com o G1, o STF analisou dois casos que tratam de questões relacionadas ao tratamento médico de membros da religião. O grupo acredita que a Bíblia exige a abstenção de sangue, que consideram com uma representação da vida, o que os faz evitar a transfusão por qualquer meio para obedecer à Deus.
Um dos casos questiona se um paciente pode recusar tratamentos médicos que envolvam sangue de terceiros e como essa recusa deve ser formalizada. Enquanto isso, o outro discute o papel do Poder Público em relação ao custeio de tratamentos para esses pacientes sem o uso de transfusões. Os casos começaram em instâncias inferiores da Justiça e chegaram ao Supremo por conta da sua relação com princípios constitucionais, como saúde e dignidade da pessoa humana.
Casos
Um dos processos, sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, envolve uma paciente de Alagoas que precisava de uma cirurgia de substituição de válvula aórtica pelo Sistema Único de Saúde. Por ser Testemunha de Jeová, ela optou por realizar o procedimento sem transfusões, mesmo com os riscos. Entretanto, a Santa Casa de Misericórdia de Maceió apresentou a assinatura de um termo de consentimento para eventuais transfusões, o que levou ao cancelamento do procedimento.
A paciente recorreu à Justiça para garantir a cirurgia sem transfusões, mas tanto na primeira quanto na segunda instância, ocorreu a negação do pedido. Isso porque a Justiça afirmou que não havia garantias de que a cirurgia seria segura sem a transfusão. O outro caso, com relatoria do ministro Barroso, envolve um paciente do Amazonas que solicitou realizar uma cirurgia ortopédica em um hospital público sem transfusões. Nas instâncias inferiores, o Poder Público recebeu a condenação e precisou custear o tratamento para respeitar as convicções religiosas do paciente.
Votos
Os relatores, ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, apresentaram seus votos na semana passada. Barroso defendeu que as Testemunhas de Jeová têm o direito de recusar transfusões em qualquer procedimento médico. Além disso, citou que o Poder Público deve fornecer tratamentos alternativos no SUS, desde que os custos sejam razoáveis. “Existe direito das pessoas que professam a religião Testemunhas de Jeová de recusa à transfusão de sangue em qualquer procedimento médico”, declarou.
Ele também enfatizou que a recusa deve acontecer por um paciente maior de idade, capaz e de forma livre, autônoma e sem coação. Antes da decisão, é necessário que o paciente receba informações médicas completas sobre os riscos do tratamento. O relator do segundo caso, ministro Gilmar Mendes, acompanhou o voto de Barroso e destacou que o médico não pode impor tratamentos que o paciente recusa. “A autodeterminação e liberdade de crença… impedem a atuação forçada dos profissionais de saúde, mesmo em risco iminente de morte do paciente”, afirmou.