Gêmeos de pais diferentes. Essa é a premissa da série “Pedaço de Mim”, nova produção brasileira da Netflix estrelada por Juliana Paes, Vladimir Brichta e Felipe Abib. Mas, apesar de parecer algo realmente restrito à ficção, esse fenômeno pode ocorrer na vida real. “Chamamos de superfecundação heteroparental quando, no mesmo ciclo menstrual, a mulher libera dois óvulos e cada um deles é fertilizado pelo espermatozoide de um homem diferente. Nesses casos, a mulher desenvolverá uma gestação de gêmeos, cada um de um pai diferente, pois óvulos diferentes foram fertilizados por espermatozoides diferentes”, explica o Dr. Fernando Prado, especialista em Reprodução Humana, membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e diretor clínico da Neo Vita.
O médico explica que, para que a superfecundação heteroparental ocorra, são necessárias duas condições: “Primeiro, a mulher precisa ter liberado dois óvulos no mesmo ciclo menstrual, o que é incomum. Pode acontecer, mas, normalmente, a espécie humana libera apenas um óvulo em cada ciclo”, diz o especialista. “Além disso, a segunda condição é que, nesse ciclo em que dois óvulos foram liberados, a mulher tenha relações sexuais com dois homens diferentes para que cada um fertilize um dos óvulos”, afirma o Dr. Fernando, que acrescenta que é difícil determinar o intervalo de tempo em que essas relações devem acontecer para levar a uma superfecundação heteroparental. “A ovulação e as relações sexuais devem acontecer no mesmo ciclo menstrual, mas existe um intervalo de alguns dias. Podemos pensar em um período máximo, com certa margem, de uma semana. Esse é um tempo em que os óvulos conseguiriam ser liberados e se manter vivos para serem fertilizados. Em um período maior, seria extremamente difícil acontecer.”
De qualquer maneira, a superfecundação heteroparental é um fenômeno muito raro, pois muitas coincidências precisam ocorrer simultaneamente. “A chance de um casal sem dificuldade para engravidar conseguir uma gravidez natural em um ciclo menstrual já é de apenas 10 a 15%. A probabilidade dessa gravidez ser gemelar já é bastante rara por si só: de um a cada 250 nascimentos”, pontua o médico. “Com relação à superfecundação heteroparental propriamente dita, não temos uma estatística precisa na literatura médica que consiga determinar qual é realmente a chance de isso acontecer, pois é necessária a ovulação de mais de um óvulo no mesmo ciclo menstrual, a relação com dois parceiros diferentes em um curto período, a fecundação e a implantação de dois óvulos e o desenvolvimento da gravidez. Então, é extremamente raro; é praticamente como ganhar na loteria mesmo.”
Segundo o Dr. Fernando Prado, em caso de suspeita de superfecundação heteroparental, a melhor maneira de confirmar o fenômeno e determinar a paternidade das crianças é por meio do exame de DNA. “Durante a gestação, também é possível fazer uma coleta de sangue do cordão umbilical de cada um dos bebês e realizar esse teste de DNA. Mas é um procedimento bastante arriscado e perigoso, então não é indicado nesses casos. Preferimos aguardar o nascimento da criança e só então fazer o teste de DNA”, diz o médico.
Por fim, o especialista ressalta que esse fenômeno de superfecundação heteroparental só tem chance de acontecer em uma gravidez natural, mas não em procedimentos de Fertilização in Vitro, apesar de ser uma técnica conhecida por gerar gestações gemelares. “Isso porque, na Fertilização in Vitro, utilizamos o sêmen de apenas uma pessoa. A superfecundação heteroparental só ocorreria durante uma FIV se fosse feita de maneira intencional, se o especialista propositalmente fertilizar dois óvulos com espermatozoides diferentes. No entanto, esse tipo de conduta é vetado pelo Conselho Federal de Medicina”, finaliza.
FONTE: Dr. Fernando Prado: Médico ginecologista, obstetra e especialista em Reprodução Humana. É diretor clínico da Neo Vita e coordenador médico da Embriológica. Doutor pela Universidade Federal de São Paulo e pelo Imperial College London, de Londres – Reino Unido. Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo, é membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e da Sociedade Europeia de Reprodução Humana (ESHRE). Instagram: @neovita.br
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