Câncer de mama: histórico familiar da doença é o “menor” dos problemas

A hereditariedade é determinante em menos de 10 % dos casos. Nos outros 90% entram questões comportamentais e ambientais e aspectos relacionados aos hormônios e à vida reprodutiva

Em meio à campanha Outubro Rosa, a revista PODER online entrevistou Maria Ignez Braghiroli, médica oncologista do Hospital das Clínicas (HC-FMUSP) e chefe da Residência em Oncologia da Rede D’Or.

Na primeira entrevista, a pauta foi aumento de casos e prevenção. Agora, a conversa é sobre fatores de risco para o aparecimento do câncer de mama que, segundo Maria Ignez, são divididos em três categorias: histórico familiar, fatores comportamentais/ambientais, e aspectos relacionado à vida reprodutiva e aos hormônios.

Qual é o papel da hereditariedade no aparecimento do câncer de mama?
Apesar de importante, a herança genética é determinante em menos de 10% dos casos de CA de mama. Quem tem histórico da doença na família, principalmente em parentes de primeiro grau (mãe, tia, avó etc) deve redobrar os cuidados com o rastreamento.

Mulheres que se encaixam nesse perfil podem fazer exames genéticos para detectar alterações nos genes BRCA1 e BRCA2 que aumentam muito as probabilidades de desenvolvimento de câncer de mama e de ovário. Em caso positivo, algumas optam por passar por uma mastectomia bilateral profilática – como fez Angelina Jolie que, posteriormente, passou por uma segunda cirurgia para retirar ovários e trompas. Claro que, em um caso como esse, a atriz fez testes genéticos prévios e sua decisão foi pautada pelos resultados e o parecer de seu médico.

Se a hereditariedade responde por apenas 10% dos casos da doença, que fatores de risco estão presentes nos outros 90%?
Questões comportamentais/ambientais, por exemplo, não devem ser desconsideradas. Para se ter uma ideia, a Organização Mundial de Saúde (OMS) coloca tabagismo e sobrepeso como os dois fatores de risco mais importantes (primeiro e segundo, respectivamente) para o aparecimento do câncer em geral – o de mama, incluído, principalmente na pós-menopausa.

O excesso de peso, por exemplo, provoca um estado crônico de inflamação no corpo que pode interferir negativamente no processo de renovação celular, no funcionamento do sistema imune, na regulação hormonal e na microbiota (microrganismos que habitam naturalmente o nosso corpo).

O sobrepeso na menopausa complica um pouco mais a situação, já que, além da inflamação crônica em si, a incidência de câncer de mama é maior em mulheres acima dos 50 anos, especialmente entre aquelas que estão com excesso de peso. Para as que trataram câncer de mama estar acima do peso também é fator de risco para a recorrência da doença.

Por isso, a importância de manter uma alimentação balanceada e de praticar exercícios físicos com regularidade, dois bons hábitos que não só ajudam a manter o peso sob controle, mas beneficiam a saúde de maneira geral.

E o aumento da expectativa de vida tem alguma influência no surgimento do câncer de mama?
Sim, e não só no aparecimento do câncer de mama, mas também de outros tipos de câncer. Isso acontece porque a renovação celular perde sua eficiência com o passar dos anos, criando um terreno favorável para “defeitos” como a multiplicação desordenada das células, alteração que está na origem da doença. No caso do câncer de mama, o risco aumenta com a idade.

Por que aspectos relacionados à vida reprodutiva e a questões hormonais estão entre os fatores de risco?
A exposição endógena ou exógena aos hormônios estrógeno e progesterona funciona como estímulo para as células da glândula mamária e, quanto maior a exposição, maior o risco de desenvolver câncer de mama. Assim, quem iniciou os ciclos menstruais mais cedo (com menos de 12 anos), nunca engravidou, teve a primeira gestação após os 30 anos ou teve menopausa mais tardia (com mais de 55 anos) corre mais risco de desenvolver a doença.

Esse mesmo raciocínio explica o risco maior de câncer de mama em contextos de contracepção oral e de terapia de reposição hormonal pós-menopausa com estrógeno e progesterona combinados. Por isso, é fundamental fazer acompanhamento com um médico para que ele avalie o que é indicado ou não em cada caso.