O mercado de créditos de carbono ainda não foi regulamentado no Brasil, mas já é uma realidade no ambiente de negócios. Empresas vêm se comprometendo com metas netzero e é sabido que diversas delas só poderão cumpri-las comprando esses créditos (o chamado mercado offset) de produtores de serviços ambientais.
Pensando nesse segmento, Marina Cançado, que liderava área de wealth da XP, fundou recentemente com Fábio Galindo a Future Carbon Group, em que atua como CoCEO. Ela explica a PODER ONLINE o que a motivou e as perspectivas para esse setor no Brasil.
PODER ONLINE – Deixar a XP, que vem fazendo grandes esforços em ESG, para entrar numa empresa de mercado de carbono, algo que ainda não está regularizado no Brasil, não é passo arriscado?
MARINA CANÇADO – Uma das características mais marcantes da minha vida profissional é que sou tomadora de risco, e isso me move a expandir fronteiras. Sempre tive também um senso de urgência em relação às questões geracionais, e o grande desafio que temos nesta geração é a crise climática.
Mesmo não havendo ainda regulação no Brasil, o mercado voluntário de créditos de carbono não é novo, tem atores relevantes. No mundo, movimentou US$ 2 bi em 2021 e pode chegar a US$ 50 bi, segundo a consultora Mckinsey, sendo o Brasil o país com maior potencial de geração de créditos. Nós, na Future Carbon, já temos o maior portfólio de créditos de carbono de florestas e de energias renováveis. E a maior deles já está vendida antecipadamente para players internacionais.
Quero levar esse mercado para outro patamar, imprimindo a escala e a relevância que o Brasil merece, mantendo a floresta em pé e possibilitando a prática de um agro mais sustentável.
PODER ONLINE – Quais são as necessidades prementes (regulatórias, inclusive) para o mercado de carbono deslanchar?
MC – Na minha visão, a regulação pode ajudar, sem dúvida, pois estabeleceria metas e limites de emissão de gases de efeito estufa para setores e empresas que precisam acelerar sua jornada climática, como já acontece em 68 regiões do mundo. Mas não é só esse o problema. Na nossa visão, a escala não chegou por conta de modelos de negócio focados em consultoria ao invés de valor compartilhado na geração conjunta do ativo crédito de carbono. Também pelo distanciamento do mercado financeiro, uma vez que é necessário capital intensivo para escalar. E pela falta de tecnologia na implementação das diversas fases de projetos de longo prazo, entre outros.
A Future Carbon tem o propósito de criar um mercado de carbono 2.0, que passa pela união de excelência técnica de quem têm experiência e vivência, junto com sofisticação financeira, alta governança, tecnologia e atuação global. Acreditamos que com esses elementos poderemos contribuir para o amadurecimento do mercado de carbono – independentemente de ser voluntário, regulado ou um mix de ambos.
PODER ONLINE – Tomando como exemplo a Ambipar, há uma tendência à concentração nesse mercado?
MC – Todo mercado em amadurecimento busca escala e, para isso, precisa de capital intensivo e crescimento rápido. A venda é uma opção comum, mas não é o caminho que visualizamos no curto prazo. Além de ceder equity para ter mais capital para investimento, há outras estratégias na Future Carbon, como venda antecipada de fluxos futuros de créditos de carbono, potencialização da nossa trading de carbono, constituição de fundos com investidores para compra de terras, uso de mecanismos de dívida como lançamento de letras de crédito agrícolas.
PODER ONLINE – Qual sua expectativa em relação a esta COP 27?
MC – Diz-se que sempre há uma COP marcante seguida por outra mais modesta. Senti isso acompanhando esta [do Egito] à distância. Não devemos sair nem com os compromissos nem com as ações que precisamos. Talvez o destaque do ano esteja ainda por acontecer, a COP da Biodiversidade, que acontecerá no Canadá, em dezembro, e terá foco total nessa agenda. Dois fatos marcantes, de todo modo: o Brasil ali em peso, inclusive com o governo futuro, e a sociedade civil representada por povos indígenas e populações negras; e a união para uma atuação mais coordenada de Brasil, Congo e Indonésia, maiores geradores de créditos de carbono de desmatamento evitado por conta de suas florestas.