Quando o assunto é inclusão nos ambientes corporativos, ocorre um senso comum de que o grande desafio dos gestores de recursos humanos é encontrar pessoas diversas e com currículo suficiente para assumir os cargos – em especial, os de liderança. Seguindo essa lógica, as empresas teriam que “baixar a régua” nos processos seletivos para compor, enfim, um time plural, com profissionais de diferentes gêneros, raças e perfis sociais.
Para alguns dos maiores especialistas no tema – com o reforço de pesquisas recentes – empresários que ainda pensam assim correm o risco de ver sérios danos à reputação e ao valor de seu negócio. Presidente do Conselho de Administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Leila Abraham Loria garante que o antagonismo entre diversidade e meritocracia já está mais que ultrapassado. “Não se trata de ‘baixar a régua’ nos processos seletivos. Mas entender que essa mesma régua mudou de lugar e ficou mais complexa”, explica. “No passado, as exigências eram mais relacionadas aos hard skills, se o profissional havia feito a melhor faculdade ou se falava vários idiomas. Hoje, as pesquisas sobre os futuros desafios da mão de obra ressaltam os soft skills. Desde aqueles mais comportamentais até os de inovação.”
Executiva do mercado financeiro e cofundadora do Conselheira 101, programa de incentivo ao acesso de mulheres negras em conselhos de administração, Jandaraci Araújo reforça que uma equipe composta 100% de homens brancos e hipergabaritados não é garantia de sucesso. “Quando a gente pensa em inovação, de onde virão as novas ideias? Na concordância ou na discordância? Inclusão não é sobre baixar ou subir a régua: é sobre agregar.”
Pesquisa da consultoria britânica PwC realizada em 2020 que ouviu 3 mil profissionais de 25 empresas em 40 países, apontou que diversidade deveria ser prioridade das corporações. No entanto, apenas 26% dessas mesmas organizações tinham metas de inclusão e só 5% delas alcançaram bons resultados com programas de capacitação.
Esse desalinhamento, segundo Leila, pode ser explicado pela maneira como quem está nas posições de poder no dia a dia conduz essas ações afirmativas. “É importante que as empresas tenham metas de diversidade, como, por exemplo, alcançar um percentual maior de mulheres nas posições de liderança. Mas há outros fatores a serem considerados”, propõe a presidente do IBGC. “É essencial pensar que depois que essas profissionais entrarem nesses cargos, como elas se desenvolverão? Que planos de carreira haverá para elas?”
Equidade e inclusão
No Brasil, a presença feminina no mercado de trabalho deve chegar a 64,3% até 2030, como indica levantamento divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). De olho nessa tendência, grandes corporações nacionais vêm desenvolvendo mentorias e ações afirmativas para que as mulheres estejam em maior número não só no quadro geral, mas nos postos de comando.
A JBS, líder global em produção de alimentos à base de proteína, criou, em outubro passado, o Grupo de Afinidade Mulheres. Formado por colaboradoras que pertencem às marcas da companhia como Seara, Swift, Friboi, JBS Couros e JBS Novos Negócios, o grupo tem o objetivo de aumentar iniciativas de equidade de gênero como parte do desenvolvimento da empresa. Também estão em atuação grupos de afinidade étnico-racial, pessoas com deficiência e LGBTQIAP+.
“Temos muitas oportunidades de tornar nosso ambiente mais igualitário frente ao tema diversidade e vamos trabalhar para isso no sentido de conscientizar os colaboradores e promover iniciativas que deem resultado a curto, médio e longo prazos”, conta Luciara Rech Peil, diretora executiva de inovação e P&D, qualidade e CIEX da Seara e líder do Grupo de Afinidade Mulheres.
Em março de 2021, a JBS contratou a RM Consulting, consultoria de Rachel Maia, executiva com larga experiência em políticas de inclusão e diversidade, para impulsionar suas ações. Atualmente, a JBS também faz parte do Movimento Mulheres 360, que reúne 63 empresas para promover a diversidade e ampliar a participação feminina no ambiente corporativo.
Para Leila Abraham Loria, que, além de presidente do IBGC, é integrante do Conselho de Administração da JBS, ações como essa estão em sintonia com um futuro que se aproxima em ritmo acelerado. “As empresas não terão sucesso lá na frente se não acompanharem toda essa disrupção que a gente vive agora. Gerenciar esses talentos diversos será um grande desafio para as companhias.”