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Por Caroline Marino

“Meu objetivo é causar impacto.” Quem costuma dizer isso é Samuel Bankman-Fried, americano de 30 anos considerado um dos principais empresários de criptomoedas do mundo. À frente da FTX, exchange avaliada em US$ 32 bilhões que ameaça tirar a liderança da gigante Binance, ele acumula uma fortuna estimada em US$ 21 bilhões, segundo a Forbes. Mas faz questão de manter suas convicções e estilo de vida, destoando da excentricidade – e das polêmicas – dos bilionários do mundo e parece não estar nem aí para o luxo e a fama que os bilhões trazem.

Vegano por razões humanitárias, conhecido pelo cabelo bagunçado e por usar roupas simples, o empresário passa seu tempo no escritório, virando noites. Diz que vai doar a maior parte de sua riqueza para a filantropia com base em uma filosofia chamada “ganhar para dar”. Para se ter uma ideia, a fundação da FTX já doou mais de US$ 140 milhões para instituições que focam em frentes como direitos humanos, combate à malária e protecão ao meio ambiente. Assim como Mark Zuckerberg, Bill Gates e o megainvestidor Warren Buffett, Bankman- -Fried também é signatário do Giving Pledge, compromisso público assumido por pessoas muito ricas em todo o planeta para se desfazer da maior parte de suas fortunas em prol da filantropia, o que pode ser feito em vida ou determinado em testamento.

Filho de professores de Direito, o agora bilionário nasceu na Califórnia, nos Estados Unidos, e estudou física no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês). Foi lá que ele conheceu o chamado altruísmo efetivo, movimento fundado por dois professores de Oxford. Na prática, é fazer o bem da forma mais eficaz possível com os recursos disponíveis. A física acabou ficando de lado quando o jovem estudante foi atraído para o mercado financeiro logo no começo da carreira. Ainda na faculdade, fez estágio em uma empresa do ramo de negociação quantitativa e liquidez, e depois trabalhou com negociação de ETFs (fundos de investimentos). Já em seu primeiro trabalho, doou parte do salário para a filantropia. Em 2017, ele vislumbrou boas oportunidades no comércio de criptomoedas e criou a Alameda Research, empresa de negociação quantitativa de criptomoedas. “Havia grande demanda, volatilidade, influxos, valorização de preços, e muita atenção e interesse, mas a infraestrutura não estava lá”, disse em entrevista ao Yahoo americano. Em 2019, veio a FTX, uma das principais empresas do mundo para compra e venda de derivativos de criptomoedas. O negócio começou as atividades em Antígua e Barbuda, na América Central; depois montou escritórios em Hong Kong; e, recentemente, mudou a sede para Bahamas. A decisão de ficar fora dos Estados Unidos é para escapar da regulação a fim de oferecer mais produtos financeiros, como ações tokenizadas (ativos digitais vinculados a ações reais mantidas por um custodiante que, no caso da FTX, é um banco alemão) e futuros. Mas ele sempre reforça que a FTX é móvel e pode fazar as malas a qualquer hora.

Atualmente, a exchange tem um volume diário de negociação de US$ 19 bilhões e é considerada uma das maiores do mundo, segundo o CoinMarketCap. Além de atrair investidores em todos os lugares do planeta, virou nome de estádio – agora, o time de basquete Miami Heat joga na FTX Arena –, e faz parcerias com celebridades. Na lista, estão nomes como o quarterback Tom Brady e a modelo Gisele Bündchen. E seguindo sua regra de “ganhar para dar”, 1% de todas as taxas líquidas são doadas para as instituições filantrópicas.

Até mesmo na política, Bankman-Fried vem deixando sua marca. No último ciclo eleitoral, contribuiu mais para a campanha do presidente Joe Biden do que qualquer um, exceto Michael Bloomberg: foram cerca de US$ 5,2 milhões, segundo a Comissão Eleitoral Federal dos Estados Unidos.

ALTRUÍSMO EFETIVO

Parte da lógica altruísta também está em andamento para o mercado financeiro. Além de colaborações recorrentes que beneficiam os menos favorecidos, no último ano, Bankman- -Fried iniciou linhas de crédito e resgates para aliviar os problemas de algumas das empresas de criptomoedas. Não surpreende, então, que ele tenha sido comparado ao que o banqueiro John Pierpoint Morgan fez durante a crise finandeira de 1907 ao minimizar o pânico daquele momento organizando a injeção de liquidez no mercado de capitais.

Os resgates de SBF começaram no fim do ano passado, quando a FTX forneceu uma linha de crédito de US$ 120 milhões à exchange japonesa Liquid depois que hackers retiraram US$ 80 milhões em ativos digitais da plataforma. Este ano, a FTX adquiriu a Liquid, embora não tenha divulgado por quanto. Além disso, à medida que o mercado de criptomoedas enfrentava uma profunda crise de liquidez nos últimos meses, o jovem bilionário começou a distribuir linhas de crédito para, aparentemente, qualquer companhia que estivesse à beira do colapso, totalizando cerca de US$ 750 milhões entre FTX e Alameda Research, sua empresa de pesquisa quantitativa. Ele gosta mesmo de ser o Robin Hood das criptomoedas. “Sam é um visionário e está investindo pesado em negócios quebrados agora porque, além da sinergia com a FTX, ele entende que o mercado funciona em ciclos”, diz Raymond Nasser, gestor da Mesa BTC, carteira proprietária e CEO da Arthur Mining, empresa de mineração de bitcoins.

Outra característica do empresário é a tranquilidade. Ele não costuma se desesperar nem pensar em cenários muito ruins. Mesmo com o preço do bitcoin caindo abaixo de US$ 20 mil, observa que as coisas poderiam ter sido piores e não está “superpreocupado” com a implosão da indústria tão cedo. Até porque, com uma rodada de investimento de US$ 420 milhões em outubro de 2021, sua empresa passou a valer cerca de US$ 25 bilhões e as perspectivas é que esse valor aumente em breve, pois alguns relatórios indicam que a FTX está buscando levantar mais US$ 1,5 bilhão, o que levaria a empresa a uma avaliação de US$ 32 bilhões.

 

LONGE DOS EUA

Atualmente, o jovem bilionário está focado na regulamentação. Passa horas e horas do dia cuidando das questões regulatórias pessoalmente. Isso levou, inclusive, à mudança da sede, que era em Hong Kong, para as Bahamas, pois Bankman-Fried acredita que as ilhas “têm uma estrutura regulatória abrangente para cripto”. Segundo ele, o excesso de regulamentação é o maior risco para o bitcoin, mas não acredita em nada muito duro. “A indústria de criptomoedas precisa provar que é responsável e não exige regulamentações super-rígidas”, disse em entrevista para o Business Insider, site americano. “Eu só gostaria que a indústria estivesse, como um todo, fazendo um trabalho mais consciente de interface com os reguladores.” De acordo com ele, os jogadores no espaço cripto precisam ser responsáveis e mostrar que não necessitam ter regras paternalistas. Por outro lado, é importante que os reguladores e as empresas de criptos trabalhem juntos.

Ao que tudo indica, a caridade com as empresas de criptomoedas ainda vai demandar que ele gaste boa parte de sua fortuna – e de seu tempo – para ajudar o segmento a voltar aos patamares dos períodos de glória e ganhar mais credibilidade.