Gente como a gente

Paulo Vieira aprendeu cedo a transformar o riso em arma, conquistou TV e publicidade e quer levar para o horário nobre um país que não costuma se ver ali

Paulo Vieira || Crédito: Pedro Dimitrow

Por Amauri Arrais
Fotos Pedro Dimitrow

Desde que se tornou onipresente na programação da TV Globo, Paulo Vieira tem recebido todo tipo de convite. Em um deles, foi incluído num grupo de WhatsApp de antigos colegas da época da escola que trocavam fotos em que o agora amigo famoso aparecia: “Olha eu, fulano e o Paulo”. O ator e humorista de 29 anos diz ter rido ao ver as imagens: todas mostravam uma criança rechonchuda em segundo plano, comendo um lanche sem encarar a câmera por não ter sido chamada para posar. “Na escola eu era do time perdedor, mas como todo bom hipster fiz do fato de ser perdedor um estilo de vida”, diverte-se. Nascido no interior de Goiás, Paulo se mudou criança com a família para Palmas, capital do Tocantins, onde começou a fazer teatro aos 5 anos. Dessa época, lembra de já querer trabalhar na televisão para melhorar de vida e também das brincadeiras com a mãe, Conceição, que incentivava a imaginação dos dois filhos com personagens como “as crianças educadas” quando havia visita em casa.

Paulo aprendeu cedo a usar o humor como arma, reação ao “absurdo da vida”. Com um desses absurdos se deparou já na adolescência, ao perceber que não se enquadrava no grupo dos meninos que podiam paquerar quem quisessem. “No colégio, eu sabia que não era uma opção de namoro porque era preto e gordo. O preto mais padrão da minha turma já não namorava.”

Com a família, que sempre foi fonte de inspiração, aprendeu a rir dos próprios dramas cotidianos. “A gente é um povo muito bem-humorado, que garimpa a risada como se fosse um diamante”, descreve. O pai, Luisão, virou personagem de um dos fios famosos do aplicativo, acompanhado pelos seus mais de 600 mil seguidores no Twitter: as histórias de empreendedorismo fracassado com o amigo Pablo devem virar série no Globoplay.

Paulo conquistou seu espaço na TV como assistente de Fábio Porchat na Record, depois de se destacar em competições de humor. Desde os primeiros quadros, como o “Emergente Como a Gente”, consegue fazer graça com a classe C, raro caso de comediante que não foi cancelado pelo tribunal da internet. Ele acredita que, embora o tema principal de seu trabalho sejam as diferenças sociais, seu assunto são as pessoas. “O rico acha que o pobre é um eterno não ganhador da Mega-Sena, quando ele é muito mais complexo que isso. A falta de dinheiro atravessa o pobre, mas ele também tem vontades, sonhos, ele dá um jeito de rir.”

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“O rico acha que o pobre é um eterno não ganhador da Mega-Sena, quando ele é muito mais complexo que isso. A falta de dinheiro atravessa o pobre, mas ele também tem vontades, sonhos, ele dá um jeito de rir.”

O ator também vê uma evolução de como a televisão passou a mostrar essa fatia do público. Quando apresentou o projeto do seu programa mais recente, o Avisa Lá que Eu Vou, à Globo, sentiu que havia em algumas pessoas uma expectativa por histórias e personagens pitorescos. Na atração do GNT, que ganhou quadro no Fantástico, viajou por dez cidades do interior do Brasil conversando com pessoas comuns. Os espectadores contaram nas redes terem se comovido com alguns relatos.

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“Acho que a diferença de tom é porque [o programa] se apresenta de maneira afetiva. Não tem como eu ridicularizar minha mãe. É um programa bem-humorado, mas o objetivo final dele não é fazer rir”, define o apresentador, que não esconde a empolgação com a atração de que mais se orgulha.

Paulo também já atraiu muitos fãs – e haters – por deixar claras suas opções políticas. Num vídeo célebre, apareceu com a namorada exibindo uma bandeja de doces na volta do casamento do ex-presidente Lula com a socióloga Janja, em maio. Logo após a eleição de 2018, diz ter sofrido muitas ameaças na internet de apoiadores de Jair Bolsonaro durante o espetáculo em que atuava no Rio.

Hoje rosto de uma dezena de marcas, há 12 anos lembra ter ouvido de uma empresa que adoraria que estrelasse uma de suas campanhas, mas que antes precisava apagar posts de teor político. Ao questionar quais seriam as publicações, recebeu algumas com a frase Black Lives Matter. “Nunca estive disposto a fazer certos silêncios em público, seja por publicidade ou qualquer outra coisa. Sempre soube que o que era para ser meu viria com a complexidade que eu carrego”, diz.

“Nunca estive disposto a fazer certos silêncios em público, seja por publicidade ou qualquer outra coisa. Sempre soube que o que era para ser meu viria com a complexidade que eu carrego”

Nem mesmo os questionamentos recorrentes sobre sua sexualidade o tiram do sério. Paulo namora há cinco anos a influenciadora digital Ilana Sales, que já apresentou aos seguidores como seu “namorado secreto”. Ele tem uma teoria sobre as piadas. “O homem brasileiro precisa atender a certos pré-requisitos e eu não estou disposto a preencher. Boa parte das minhas referências na comédia são gays, como Dzi Croquettes.”

O ator também não se enquadra muito em rótulos, como mostra a quantidade de projetos dos últimos anos: além dos quadros e programas, acaba de publicar um livro infantil, tem um EP gravado com Tulipa Ruiz, atuou e dirigiu no teatro. Na lista do que virá, além da nova série inspirada no pai, estão um programa infantil, um reality e um longa baseado no quadro “Isso É Muito a Minha Vida”.

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A legião de fãs também cresceu, mas Paulo afirma ainda manter a mesma rotina. Durante as viagens, já atendeu convites de desconhecidos no Twitter para tomar uma cerveja ou ir a uma festa de aniversário. “Não quero deixar de fazer as coisas boas da minha vida. Todo dia eu saio de casa para fazer amigos.”

Styling: Isabela Marques
Make: Tibby Ramos
Visagista: Jonathan de Oliveira
Direção de arte: David Nefussi
Produção executiva: Ana Elisa Meyer
Assistente de fotografia: Humberto Felga
Tratamento de imagem: RG Imagem