Por Ana Fontes – empreendedora social, fundadora da Rede Mulher Empreendedora e do Instituto RME, Delegada Líder BR W20/G20 e LinkedIn Top Voices 2020
Quando decidi começar meu próprio negócio, depois de quase duas décadas no ambiente corporativo, percebi que as dificuldades e os obstáculos no empreendedorismo eram diferentes para homens e mulheres. E, entre as próprias mulheres, as condições não eram as mesmas se elas fosses negras, nordestinas e de origem simples, como era meu caso.
Em primeiro lugar, devemos entender que as mulheres foram e são as mais marginalizadas no ambiente de trabalho e profissional. É uma corrida desigual, na qual partimos sempre em desvantagem e precisamos provar nossa competência a cada volta.
Nesta pandemia, que já se estende por mais de um ano e meio, o cenário de desigualdade talvez tenha alcançado o ápice. Além da alta taxa de desemprego geral, a participação da mulher no mercado de trabalho no país caiu ao menor índice nos últimos 30 anos.
Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no primeiro trimestre deste ano, as mulheres representavam menos de 40% da força ativa de trabalho. Antes da pandemia, a média superava os 50%.
Boa parte dessas mulheres desempregadas viu no empreendedorismo uma saída para amenizar essa realidade. Contudo, a Covid-19 também afetou os pequenos negócios, obrigando muitos deles a fechar as portas.
Embora a crise tenha prejudicado diversos setores produtivos, os segmentos mais castigados foram os de serviços, como hotelaria, alimentação, beleza e domésticos, postos ocupados em sua maioria por mulheres. Daí o impacto tão forte no desemprego delas e no próprio empreendedorismo feminino.
Além disso, é importante levar em conta outras desigualdades, como a dupla jornada de trabalho, a falta de crédito bancário, o preconceito estrutural e a violência doméstica. Dados do Ministério Público de São Paulo registraram um crescimento de mais de 40% de violência dentro de casa e de feminicídio nos últimos 12 meses do ano.
Nesse cenário, deparamo-nos com iniciativas de algumas instituições privadas e de organizações não governamentais que entenderam as necessidades dessas mulheres e ajudam a diminuir os números dessa vulnerabilidade social.
Eu, diretamente envolvida em diversas dessas ações, posso dizer que o empreendedorismo é uma das principais portas para a geração de renda e para a independência financeira da mulher.
Mas precisamos enxergar esse empreendedorismo de forma justa, entendendo as diferenças e as dificuldades pontuais, criando assim condições para que mulheres realmente tenham formas de decidir sobre seus próprios negócios e sobre sua vida.
Quando investimos no empreendedorismo feminino, investimos também na própria sociedade. Quando uma mulher gera receitas, ela compartilha seus ganhos para o bem-estar de sua família e do seu entorno, promovendo educação e desenvolvimento social.
E tem sido elas também as que melhor adequaram os negócios às novas exigências destes tempos desafiadores, buscando aprender sobre digitalização, relacionamento com clientes e formas de inovar mesmo no seu pequeno negócio. E criam um círculo virtuoso, quando têm vagas de trabalho contratam outras mulheres.
Sei que temos um longo percurso pela frente. Mas, quando olho para trás, tenho a certeza de que a luta é fundamental e a causa necessária para inclusão e justiça social.