Como a redução da jornada de trabalho impacta os trabalhadores

Como a redução da jornada de trabalho impacta os trabalhadores
Imagem: Reprodução/BemParaná

A proposta de emenda constitucional que visa reduzir a jornada semanal de trabalho para 36 horas vem ganhando atenção no Congresso e nas ruas. Apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL), a medida propõe uma carga horária semanal reduzida sem alterar o limite de oito horas diárias. A ideia é extinguir a escala de trabalho 6×1, especialmente comum nos setores de comércio e serviços.

Com três dias de folga para cada quatro trabalhados, essa proposta busca promover mais qualidade de vida aos empregados e adotar uma tendência global por uma carga horária mais flexível. Especialistas, no entanto, veem pontos positivos e desafios na medida. Vamos explorar os impactos e as possibilidades de implementação.

O que a proposta traz de novo?

A emenda proposta ao inciso XIII do artigo 7º da Constituição Federal implica mudanças no modelo de trabalho vigente. Se aprovada, exigiria ajustes também nos artigos 58 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo o advogado constitucionalista Godofredo Dantas Neto, a alteração é constitucional, pois não envolve cláusulas pétreas. Contudo, ele ressalta que a PEC exigirá maioria qualificada para ser aprovada, o que representa um desafio político.

Para a advogada Juliana Mendonça, especializada em direito do trabalho, a proposta pode alterar drasticamente a dinâmica laboral, especialmente em setores que dependem de trabalho contínuo, como comércio, hotelaria e alimentação. “Esses setores provavelmente terão de reestruturar horários e talvez contratar mais profissionais para cobrir as folgas”, explica.

Setores mais impactados

O comércio e os serviços devem sentir o impacto da mudança caso a PEC seja aprovada. Esses setores geralmente utilizam a escala 6×1 para manter as operações, inclusive nos finais de semana. Juliana Mendonça aponta que a implantação do sistema 4×3 pode exigir contratações adicionais ou maior uso de horas extras, especialmente em períodos de alta demanda.

No setor de hotelaria e alimentação, onde a atividade é intensa e ocorre em turnos variados, a necessidade de mão de obra é ainda maior. Para esses empregadores, a mudança pode representar um aumento nos custos de operação devido à reestruturação de turnos e contratação extra. “Se a carga horária for reduzida, esses setores terão de se adaptar para manter a produtividade sem onerar tanto o orçamento”, completa Mendonça.

Benefícios da jornada reduzida

Um dos maiores atrativos da proposta é a possível melhora na qualidade de vida dos trabalhadores. Com mais dias de descanso, há maior tempo para lazer, convívio familiar e atividades pessoais. Segundo Godofredo Dantas Neto, o descanso prolongado pode ajudar na produtividade e diminuir o absenteísmo, pois os trabalhadores tendem a enfrentar menos estresse e fadiga.

Além disso, uma rotina com mais folgas pode reduzir a alta rotatividade em setores como o comércio, onde a carga de trabalho é intensa e os funcionários costumam se queixar do esgotamento. “Oferecer mais dias de folga pode ajudar a manter profissionais por mais tempo nas empresas, diminuindo os custos com substituições e treinamentos”, explica Mendonça.

Desafios e possíveis consequências econômicas

Apesar dos benefícios, a proposta traz desafios. Juliana Mendonça alerta que a redução de jornada pode levar algumas empresas a contratarem trabalhadores informais ou autônomos para evitar o aumento de despesas com pessoal. Isso pode afetar negativamente a formalização dos trabalhadores, tirando a proteção de leis trabalhistas específicas.

Além disso, a medida pode impactar diretamente trabalhadores que recebem por hora. Como a remuneração é proporcional às horas trabalhadas, uma jornada reduzida sem reajuste de salário pode representar uma perda significativa. “Para esses profissionais, é importante que o cálculo de horas seja revisto para evitar redução de renda”, afirma Mendonça.

O setor econômico também pode sentir efeitos indiretos. O advogado Dantas Neto destaca que empresas menores, com margens de lucro reduzidas, podem enfrentar dificuldades em arcar com novas contratações ou gastos extras com horas adicionais. Isso pode impactar diretamente os preços dos produtos e serviços oferecidos, elevando o custo de vida.

Implementação gradual e necessidade de avaliação

Diante dos potenciais desafios, Mendonça sugere que a implantação da medida ocorra de forma gradual e seja testada em setores específicos antes de se tornar uma exigência nacional. “Uma abordagem por fases permite que o impacto econômico e trabalhista seja avaliado e ajustado conforme necessário”, recomenda.

Negociações sindicais também podem auxiliar na avaliação dos impactos da proposta para diferentes categorias. Testes setoriais permitem verificar a viabilidade da jornada reduzida e evitar instabilidades no mercado de trabalho.