A tragédia anunciada do Rio Grande do sul e a solstalgia: até quando vamos ignorar os avisos do nosso planeta?

Por Luciana Brafman

“Solastalgia” é um termo cunhado pelo filósofo e ambientalista Glenn Albrecth, que significa “saudade que sentimos de casa enquanto ainda estamos em casa”. A tragédia gaúcha soma mais de 145 mortos, 756 feridos, 132 desaparecidos e mais de 2,1 milhões de vidas devastadas. Faltam água, comida, luz ou teto para mais de 444 cidades (mais de dois terços do estado) afogadas pelos temporais.

O que acontece no Rio Grande do Sul não se trata de um fenômeno natural irresistível, mas de uma tragédia esperada, para qual o estado foi alertado em 2014 pelo relatório Brasil 2040, que custou mais 3.5 milhões de reais e, mesmo assim, foi solenemente ignorado pelas autoridades. Seja porque planos de contingência ambiental não rendem votos, seja porque havia outros interesses corporativos em jogo, o fato é que se preferiu engavetar o aviso de que os próximos anos prometiam tragédias ambientais para focar em outra coisa.

Na época, a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência taxou o estudo do Relatório Brasil de “alarmista”, já que ele previu, para os próximos anos, mudanças dramáticas como elevação do nível do mar, mortes por ondas de calor, colapso das hidrelétricas, falta de água no Sudeste, a piora das secas no Nordeste, e, é claro, o aumento das chuvas no Sul. Em maio de 2024, já não há mais como se negar a sobriedade do estudo. Só no último ano, acumulamos quatro chuvas torrenciais no Sul, uma seca sem precedentes na Amazônia e os doze meses mais quentes da história.

Ainda assim, a sensação que se tem é a de que o Estado, as corporações e a população não compreenderam bem a urgência em que o nosso planeta se encontra. As chuvas gaúchas sucedem monumentais tragédias ambientais, como a de Brumadinho, Mariana, Petrópolis e do Litoral de São Paulo. Ainda assim, demoraram para receber uma resposta à altura de sua seriedade. Foi somente após a imprensa e celebridades e influenciadores gaúchos se posicionarem em prol do Estado que o Brasil acordou para o desastre que acomete o Rio Grande do Sul.

Será que estamos condenados a somente refletir sobre como conduzimos a vida no planeta durante as poucas semanas que sucedem desastres ambientais? E quantas tragédias serão necessárias até que assumamos um posicionamento verdadeiramente sustentável? Hoje os gaúchos sentem solastalgia.

Nossa responsabilidade coletiva é enorme, mas nosso potencial como nação é igualmente forte. Devemos unir esforços para implementar soluções sustentáveis, promover a educação ambiental e pressionar por políticas que protejam nosso planeta e suas comunidades vulneráveis. A emergência climática não pode ser ignorada ou minimizada. Ela é um chamado para ação urgente e decisiva. Juntos, podemos e devemos fazer a diferença, antes que seja tarde demais.

Há sim tempo para agir e ele começa agora!

 

Sobre Luciana Brafman 

CEO da Time to Act. Ela tem duas indicações ao Emmy no currículo e há anos se dedica à interseção entre o universo das artes e do ativismo climático.