Com a erudição de um estudioso e a imaginação de um artista, o arquiteto, cenógrafo e designer italiano Renzo Mongiardino criou interiores que deslocaram os padrões estéticos vigentes no século 20
por Ana Elisa Meyer
O minimalismo com certeza não é um conceito que podemos usar para descrever os projetos de Renzo Mongiardino. Utilizando romantismo exuberante e referências clássicas, ele foi responsável pela decoração dos ambientes das casas de alguns dos nomes mais importantes da alta sociedade europeia e americana do século 20.
Nascido em Gênova, em 1916, e filho único de Giuseppe Mongiardino, um empresário de teatro que introduziu a televisão a cores na Itália, Mongiardino cresceu em um palazzo do século 18 onde, certamente, começou a nutrir seu fascínio pelos suntuosos interiores. Aos 20 anos ele se mudou para Milão para estudar arquitetura na Universidade Politecnico di Milano. E, a partir de 1945, iniciou sua carreira multifacetada focando principalmente na criação de espaços residenciais, cenografia para teatro e direção de arte para cinema.
Preferindo o título de “criador de ambiente” ao de “decorador”, Mongiardino teve como clientes não apenas algumas das personalidades da elite financeira do mundo, mas também alguns dos mais cultos. Sua lista incluía a condessa Cristiana Brandolini d’Adda, as socialites Lee Radziwill e Marie-Hélène Rothschild, os estilistas Valentino e Gianni Versace, entre outros. Como eram pessoas com inclinação estética singular, a atenção que dedicava ao aprendizado sobre suas vidas, combinada com a própria erudição nas questões de estilo, fez dele uma figura muito influente e poderosa. Iniciava os seus projetos perguntando: “Qual é a sua paleta de cores favorita, e o que você coleciona?” – sabia que colecionadores consumados geralmente estariam mais interessados em exibir dramaticamente os seus tesouros do que detalhes arquitetônicos. Assim, a compreensão das características da sua clientela se tornou fundamental para a organização de seus esquemas decorativos. Um exemplo foi o projeto da suntuosa residência parisiense no Hôtel Lambert, de Guy e Marie-Hélène de Rothschild, onde foi desafiado a desenhar algo que exibisse as volumosas coleções de arte e objetos do casal da alta sociedade francesa. “A casa de uma pessoa é uma escolha de vida, uma cidadela – agradável e desarma- da, mas equipada para deter aqueles que não são bem-vindos e para abraçar aqueles que são amigos”, escreveu em seu livro Roomscapes: The Decorative Architecture of Renzo Mon- giardino, lançado em 1993.
Tendo o Renascimento e a própria cultura italiana como seus maiores guias, trazia em muitos de seus interiores a opulência bizantina romântica, caracterizada pelos tons das joias, os infinitos padrões de desenho dos tapetes persas, painéis de parede de couro, o excesso de superfícies de mármore e mosaico. O que nem todos sabiam é que muitos desses materiais, vistos como suntuosos, eram simplesmente falsos. As paredes de couro da propriedade rural inglesa de um industrial, por exemplo, eram na verdade papelão habilmente pintado e envelhecido. Isso era parte da impressionante encenação do designer que sempre se interessou pelo efeito que suas escolhas produziam para a atmosfera dos ambientes, e que foi aprendido em uma carreira paralela como cenógrafo para diretores como Franco Zeffirelli e Gian Carlo Menotti.
A distinta carreira de Mongiardino nas artes cênicas incluiu a produção de óperas como Tosca, encenada em 1964 e dirigida por Franco Zeffirelli, e La Traviata, de 1972, dirigida por Giancarlo Menotti. No cinema, criou os cenários para os filmes Romeu e Julieta (1968), A Megera Domada (1967) e Irmão Sol, Irmã Lua (1972) do diretor italiano Zeffirelli. Por esses dois últimos trabalhos foi indicado ao Oscar. Certamente, Mongiardino levou suas habilidades na criação de ilusões e drama visual para seus projetos residenciais. A prática de empregar modelos em maquetes, permitindo que visualizasse de forma plena a dinâmica espacial, as relações proporcionais junto com a circulação e o jogo de luz ao longo do dia e da noite. Esses foram aspectos centrais para o seu processo criativo.
À época de sua morte, em janeiro de 1998, Renzo Mongiardino estava trabalhando em dois grandes projetos. Um deles era uma proposta urbanística de criação de uma cidade ideal, dentro da tradição urbanística de Urbino ou Pienza, para a qual ele tinha o apoio de um grupo de empresários italianos. Outro era a reconstrução fiel da casa de ópera La Fenice, em Veneza, que pegou fogo em 1996, e estava sendo restaurada pela arquiteta Gae Aulenti.