Um clássico da literatura brasileira chega às telas. Escrito em 1967, História da Alimentação no Brasil, do antropólogo e etnógrafo potiguar Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), virou uma série documental homônima, disponível na Amazon Prime Video. A equipe, comandada pelo diretor Eugenio Puppo, rodou por Brasil e Portugal para decifrar a mesa do brasileiro. Na pesquisa, centenas de documentos, entre cartas, anotações e fotografias do acervo de Cascudo, o mais importante folclorista brasileiro. “Não se trata apenas de um apanhado aleatório de visões sobre a alimentação, há sempre o fio condutor da narrativa desenvolvida pelo próprio Cascudo”, diz o diretor.
O antropólogo via a alimentação brasileira como resultado da triangulação das influências de Portugal, da diáspora africana e da herança indígena. A história da alimentação é, portanto, também a história da sociedade brasileira. Na série, ao lado dos cozinheiros, dos mestres artesãos, dos feirantes, antropólogos e sociólogos discutem os significados sociais e políticos da comida no Brasil. “Não é possível conceber a vida em sociedade sem olhar para a alimentação”, diz Puppo.
A série registra técnicas que estão desaparecendo, hoje apenas mantidas pelas mãos de poucos, como a preparação artesanal do azeite de dendê. “Cascudo defende que a sabedoria dos preparos tradicionais seja preservada, no sentido de valorização de uma memória cultural coletiva”, afirma o diretor, que considera ainda mais importante garantir a variedade dos ingredientes e a preservação dos nutrientes e dos sabores naturais. “Isso passa por toda uma mudança de mentalidades, que só pode ser obtida com profundo conhecimento da própria história.”
Cascudo é um dos grandes intelectuais brasileiros, filho de uma época em que se buscava pensar o “brasileiro” numa certa integridade, como também fizeram Sergio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre. Boa parte de seus livros foram redigidos numa rede – um de seus temas, aliás, de pesquisa.