Embora os deputados federais de primeiro mandato tenham chegado à metade de seus termos, alguns dão a impressão de ainda sentir certo desconforto em suas cadeiras, seja a do gabinete, seja a do plenário. Caso de Tiago Mitraud (Novo-MG), de 34 anos, vice-líder de seu partido na Câmara.
O problema pode ser o partido. A mensagem antipolítica, ou pró-gestão, ou algo que o valha, do Novo, derreteu nas redes sociais e também no plenário. O isolamento fez com que as ideias, muito ligadas ao liberalismo econômico, desaparecessem no torvelinho da Covid-19 e do auxílio emergencial.
Mitraud falou para esta série especial de entrevistas de PODER Online com os novos parlamentares. O deputado revelou que o Novo quer voltar a disputar a presidência em 2022 e que o partido não irá se submeter a práticas desabonadoras, como a troca de votos por emendas parlamentares.
Esse “trade” funcionou lindamente para eleger Arthur Maia com apoio de 302 deputados no começo do mês. O Novo com seus oito deputados federais teve um anticandidato para chamar de seu, Marcel van Hattem.
PODER Online – Como avalia as eleições para a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, que teve, inclusive, a participação do Novo?
Tiago Mitraud – A eleição da Mesa, sem dúvida, foi um acordo de ocasião entre o palácio do Planalto e a Câmara dos Deputados. Deu para ver que o presidente Jair Bolsonaro se sentiu mais vulnerável pelos problemas que ele mesmo causou e precisava tentar se fortalecer. Conseguiu. A expectativa é a de que haverá um esforço maior no Congresso para tentar resolver as diferenças com o Executivo sem usar a imprensa, como fazia Rodrigo Maia (DEM-RJ). Talvez não tenha ficado claro ao presidente, no entanto, que ele está mais na mão do Congresso do que o contrário.
PODER Online – O mandato dos parlamentares eleitos em 2018 chegou à metade após um ano especialmente difícil. O senhor é um dos mais jovens e demonstrou ser bastante idealista ao chegar aqui. Isso continua?
Mitraud – O segredo da felicidade é ter baixas expectativas, confesso. Nunca achei que ia revolucionar a política, mas sempre torci para conseguir fazer minha colaboração. Ao ingressar na carreira, mostramos que o Novo segue como alternativa distinta da política tradicional, sem precisar se submeter às práticas que muita gente abomina. É claro que as frustrações foram muitas, porque as táticas que não queremos ver estão presentes. O que destaco nestes dois anos como deputado é a nossa maior conquista até aqui: mostrar que o processo de mudança começou.
PODER Online – Como compara sua expectativa pré-mandato com a realidade encontrada na Câmara?
Mitraud – Os novos parlamentares caíram de paraquedas no Congresso. Eu fui um deles. Nunca tinha acompanhado uma sessão legislativa, apenas a do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Imaginava que não era um ambiente leve, muito amigável. Mas encontrei uma realidade muito diferente do meu ideal. Conchavos, parcerias improváveis. Teve gente que chegou aqui e logo se submeteu às velhas práticas. Ou seja, a mudança que tanto se falou no início de 2019, quando assumimos o mandato, ficou para trás em muitos lugares. Mas o Novo permanece.
PODER Online – Acha mesmo? A leitura é de um Novo enfraquecido. João Amoedo, um dos fundadores, não tem mais aquele peso em suas declarações…
Mitraud – Quem fala que estamos menores não acompanha os números. Tínhamos zero deputado nas últimas eleições e hoje temos oito. Um partido do tamanho do nosso e que vai contra o senso comum para ter notoriedade deve ser valorizado. Somos reconhecidos por nossa atuação e é isso que queremos. Nas eleições municipais, tivemos um crescimento em Belo Horizonte, São Paulo e Porto Alegre. Não dá para multiplicar isso por 20 em dois anos. Mas o resultado foi bom.
PODER Online – O Novo terá candidato próprio para presidente em 2022?
Mitraud – O partido separa muito a gestão dos mandatários, então quem define é o diretório e não as pessoas que estão no front. A opinião predominante é de que sim, teremos um candidato.
PODER Online – Existe a possibilidade de o partido fazer alianças, ganhando corpo até lá?
Mitraud – Não faremos mudanças para conseguir espaço em uma possível eleição, como fazem DEM, PSDB, MDB e outros grandes caciques da velha política. Essas legendas têm menor convicção, por exemplo, de que o presidente precisa ser derrotado em 2022. Tentaremos fazer como sempre: apresentar nossas ideias para o país em um caminho menos turbulento.
PODER Online – Essa radicalização do partido vai de encontro à proximidade do Novo com o palácio do Planalto durante a análise da reforma da Previdência, por exemplo. O que mudou?
Mitraud – Nunca houve uma proximidade entre o Novo e o Planalto. A gente sempre apoiou as pautas que achamos corretas para o país. A reforma da Previdência era uma pauta que a gente acreditava. Mas teve criação de estatal, expansão de empresa pública, compra de voto com emenda parlamentar, indicação de ministro não qualificado para o STF. E nós fomos contra. Não vamos nos furtar de apoiar ideias que acreditamos porque temos diferenças com o governo. Assim, não há que se falar em distanciamento ou aproximação. É coerência com os nossos eleitores.