Revista Poder

O ANO NO DIVÃ: 2021 na visão de quem brilhou em 2020

Nunca antes tivemos que lidar com desafios, perdas, mudanças e com o desconhecido da forma como aconteceu em 2020. Convidamos nove personagens de PODER para dividir suas reflexões, aprendizados e realizações desse ano que passou e dizer o que esperam para 2021

Por Carol Sganzerla e Dado Abreu

Daniel Goldberg || Crédito: Roberto Setton


DANIEL GOLDBERG, sócio da Farallon Capital na América Latina 2020

2020
“Foi o ano em que aprendi, por conta da pandemia, que somos incrivelmente efetivos quando colaboramos – vacina em 2020 era impensável quando a crise começou –, mas assustadoramente inefetivos gerenciando riscos – metade do mundo em março ainda se recusava a entender a gravidade potencial do problema.”

2021
“Gostaria que conseguíssemos modular essa polarização maluca que parece ter se tornado o ‘espírito do tempo’!”

Sidarta Ribeiro || Crédito: João Leoci


SIDARTA RIBEIRO, neurocientista, fundador e vice-diretor do Instituto do Cérebro da UFRN

2020
“Me reencontrei com sonhos de profunda transformação. Ano de conflitos, luta, introspecção e amor.”

2021

“Gostaria que fosse o ano em que afinal conseguiremos amar ao próximo como a nós mesmos. E isso evidentemente inclui vacina gratuita para todas e todos, sem distinção de classe social.”

 

Eliane Dias || Crédito: Paulo Freitas


ELIANE DIAS, empresária e CEO da Boogie Naipe

2020
“Passei por provações que pensei que jamais suportaria passar. O grau de intolerância das pessoas está inacreditável, me surpreendi com tanto autoritarismo e desequilíbrio mental. Este ano tive que hackear minha mente para mantê-la saudável, respirar cinco vezes mais antes de dizer sim ou não, trabalhar dez vezes mais, amar vinte vezes mais, me reinventar trinta vezes mais, rezar quarenta vezes mais e ignorar os ignorantes cinquenta vezes mais. Espero nunca mais, por toda a eternidade, ter que viver um ano como este novamente.”

2021
“Quero que em 2021 nenhuma māe chore por ter o filho assassinado pela sua cor, que o amor esteja no topo da lista de prioridades, que a Covid-19 desapareça da terra assim como surgiu, que tenha crianças brincando na rua, que a polícia apenas nos proteja, que tenha menos armas na rua, que todos tenham autoconhecimento e que se entendam consigo mesmos, que os governos horrorosos desapareçam, que as comunidades possam viver em paz, que todos ganhem pelo trabalho realizado, que a leitura volte a ser moda, que roupa cara seja cafona, que as escolas voltem a funcionar, que professor seja respeitado, que as mulheres ganhem igual aos homens, que preto possa falar de outras coisas para além de racismo, que as pessoas entendam o que é viver em comunhão, que possamos amar, ser amados, ter fé e sorrir.”

José Junior || Crédito: Stefano Martini/Arquivo Pessoal


JOSÉ JUNIOR, criador audiovisual e agitador cultural

2020
“O ano do pânico, do terror, seja pela pandemia, seja pelos governantes autoritários do Brasil e do mundo. Mas, para mim, também foi um dos melhores anos na criação de projetos. Comecei fazendo Arcanjo Renegado, série em parceria com a Globoplay, que foi um sucesso, e me envolvi em outras cinco séries. Foi o ano da retomada da esperança com as eleições americanas e o Brasil já mostrou que quer mudanças. A vitória de Eduardo Paes representa a mudança para o Rio de Janeiro. De alguma forma, ficamos mais próximos, nos preocupamos e contribuímos para a melhoria de vida do outro. Posso dizer que é a mistura do ano de Shiva com Xangô. Shiva é o deus da destruição e da transformação e Xangô, o deus da justiça. A pandemia levou muita gente, mas o ano fez certa justiça.”

2021
“Será o ano do crescimento, de um planeta mais comunitário, até porque a pandemia atingiu todas as classe sociais. Estamos vivendo uma situação que o mundo não vivia há tempos, então temos uma esperança renovada. Já começo o ano reabrindo em janeiro o AfroGames, o primeiro centro de formação de e-atletas da favela no mundo, onde o foco são jovens negros. Acho que as pessoas vão estar mais conscientes também pela questão da diversidade, de gênero, por causa do racismo, que teve altas taxas no decorrer de 2020. Em 2021, vamos colher esses frutos. No Rio, espero que a violência diminua e que a corrupção do estado vire peça de museu. É utopia, mas a vida é mesmo feita de sonhos e utopias.”

 

Miguel Srougi || Crédito: André Penteado


MIGUEL SROUGI, médico urologista

2020
“Houve medo, solidão, perdas, mas também um momento de encanto sem precedentes na história. Frente ao dilema de proteger os mais velhos e os vulneráveis ou de ignorar o vírus, preservando a opulência econômica e social, a humanidade não hesitou: aderiu ao isolamento, aceitou as perdas materiais e milhões de vidas foram salvas. Destoaram algumas autoridades maiores, de coração ruim, que ignoraram o vírus e menosprezaram o sofrimento humano. Pagarão por isso.”

2021
“Gostaria que fosse o ano em que as pessoas se esforçassem para viver em um continuum de harmonia física, afetiva e mental, sem o que não existirá bem-estar. Ademais, que procurem apurar os sentimentos de solidariedade, compaixão e identidade com os que sofrem, ajudando o mundo a se tornar menos injusto.”

 

Renata Mei Hsu Guimarães || Crédito: Arquivo Pessoal


RENATA MEI HSU GUIMARÃES, advogada na área de família e sucessões

2020
“Foi o ano fora do calendário, com um tempo muito próprio, indiferente à sucessão dos dias, por vezes visceralmente real, outras vezes onírico. Não passei por guerras, pestes, terremotos ou eventos outros que deslocassem meu eixo de vida, que independessem do meu agir, ou do não agir (também uma conduta). Sempre acreditei que a vida resulta do que você faz dela, depende preponderantemente de suas escolhas e esforços. A proximidade da morte, a fragilidade do corpo e a irracional finitude mudam essa convicção. Primeiro houve uma sensação de situação irreal e a expectativa de que fosse passageira. Depois se instalou uma sensação cinzenta de insegurança, agravada pelas imagens das cidades vazias e hospitais cheios, impotentes. Veio o medo pela falta das pessoas queridas; a necessidade de proximidade, física inclusive, daqueles que se ama. Por fim a certeza de que não se está no controle – é melhor que seja assim – e que por ora é suficiente tratar de viver um dia de cada vez, de forma simples, e tentar fazê-lo bom. 2020 é um ano para não esquecer. Para aprender.”

2021
“Queria que fosse um ano manso, que a agitação e a ansiedade decantem, que aflore e permaneça o que realmente tem relevância. E o punhado que remanescer – o que verdadeiramente importa – seja o quanto baste para se viver muito bem.”

 

Amyr Klink || Crédito: Maurício Nahas


AMYR KLINK, navegador e escritor

2020
“Profissionalmente, foi um ano muito bom, meus negócios evoluíram como nunca imaginei. Resolvi me desvencilhar de tudo que não preciso, foi um ano de depuração econômica. Resolvemos ter menos coisas, um ano de viagens e de reflexões muito interessantes. A Marina [Klink, esposa] fez uma viagem pela ancestralidade da família dela, um trabalho extremamente cuidadoso, buscou informações em Portugal, tem histórias pitorescas. Uma hora, nossas árvores genealógicas se cruzam. Sugeri que ela escrevesse a história da família dela.”

2021
“Será o ano de colocar em prática o propósito de viajar e construir mais experiências. Em 2019, criamos um programa de viagens incomuns, começou com um amigo que levei para a Antártida. Surgiu uma demanda inesperada por esses roteiros que não existem prontos, como conhecer uma região da Islândia onde é preciso negociar autorização especial, há trechos para fazer a cavalo, no gelo. A adesão foi maciça e mesmo com as viagens adiadas pela pandemia, ninguém cancelou, só atraiu ainda mais o interesse das pessoas, que não querem mais ir para Roma, Paris, não querem mais jantar no melhor restaurante do mundo.”

Renato Janine Ribeiro || Crédito: Roberto Setton

RENATO JANINE RIBEIRO, filósofo, cientista político e ex-ministro da Educação

2020
“Refletindo sobre o ano que passou, 2020 foi o que mais senti medo na vida: medo de morrer sem nem saber por quê. Medo de morrer sem ver os entes queridos. Medo de perder gente que amo.”

2021
“Gostaria que 2021 fosse o ano em que as pessoas aprendam o valor ético da solidariedade, da compaixão. Que o sofrimento de 2020 não tenha sido em vão, mas nos tenha melhorado. De que adianta pagar preço tão alto para continuar tão pobre moralmente?”

Maria Homem || Crédito: Victor Affaro/divulgação

MARIA HOMEM, psicanalista e autora de Lupa da Alma (ed. Todavia)

2020
“Foi o ano que fui convidada a escutar, às vezes aos berros, muitas coisas que haviam ficado ocultas durante tantos anos, quem sabe décadas. E agora se desvelaram sob forma de palavras ou loucuras ou adoecimentos. Como se o radar analítico tivesse sido convidado a captar a explosão em jogo nesta quarentena-revelação. Como inclusive escrevi, 2020 foi a lupa da alma.”

2021
“Gostaria que fosse o ano em que pudéssemos de fato ouvir todo esse ruído de fundo e que veio à superfície. Pois não temos mais desculpas para não ver como estamos vivendo, cada um e todos nós, tanto em nível individual quanto coletivo. O que você quer na sua vida? Que tipo de mundo e de realidade desejamos construir? Se 2020 foi o ano da crise e 2021 será seu aprofundamento, quem sabe tenhamos a chance de, no caos, desenhar projetos efetivamente inéditos.”

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