Revista Poder

Poder Saúde: Jejum intermitente na berlinda, estudo mostra aumento do risco de morte cardiovascular a longo prazo.

Os riscos podem ser maiores dependendo do período de restrição e de doenças pré-existentes. Pessoas com doença cardiovascular subjacente ou em tratamento de câncer são mais suscetíveis. A estratégia não é proibida, mas só deve ser feita se indicada e acompanhada por um profissional.

Estratégia popular de perda de peso que limita as horas durante as quais as calorias podem ser consumidas, o jejum intermitente ganhou popularidade nos últimos anos – e defensores ferrenhos. Mas um estudo recente da American Heart Association colocou em xeque a saudabilidade desse tipo de dieta: ela pode quase duplicar o risco a longo prazo de uma pessoa morrer de doença cardiovascular. “Segundo o trabalho, isso acontece especialmente entre pessoas com doença cardiovascular subjacente ou câncer”, explica a médica nutróloga Dra. Marcella Garcez, diretora e professora da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN). É interessante notar que, em 2020, um estudo já havia demonstrado que o jejum intermitente não é melhor para a perda de peso do que comer refeições consistentes, mas adequadas a um consumo calórico menor que a taxa metabólica ao longo do dia.

Estudos anteriores sugeriram que o padrão alimentar pode reduzir os fatores de risco cardiovascular no curto prazo. O novo trabalho debruçou-se em analisar os efeitos a longo prazo da alimentação com restrição de tempo. “Ainda é muito cedo para concluir que as pessoas devem evitar comer com restrição de tempo se isso as ajudar a atingir suas metas de perda de peso. Neste momento, se as pessoas quiserem comer durante um período mais curto e for mais fácil para elas manter o peso dessa forma, não há uma razão para não fazê-lo, se tiverem acompanhamento profissional”, pondera a médica nutróloga.

Dra Marcella Garcez

A alimentação com restrição de tempo, um tipo de jejum intermitente, normalmente restringe a ingestão de calorias a uma janela de quatro a 12 horas. “Pesquisas anteriores mostraram que pode ser uma estratégia eficaz para perda de peso, quando combinada com restrições calóricas. Estudos também sugeriram que pode reduzir a pressão arterial e outros indicadores-chave de doenças cardiovasculares durante um curto período de tempo em pessoas com obesidade”, diz a médica. No novo estudo, os pesquisadores analisaram dados dietéticos de uma pesquisa nacional dos Estados Unidos com 20.078 adultos norte-americanos com 49 anos de idade, em média. Em duas ocasiões, eles recordaram todos os alimentos e bebidas que consumiram num período de 24 horas.

As pessoas que restringiam a alimentação a um período inferior a oito horas por dia tinham quase duas vezes mais probabilidade de morrer de doenças cardiovasculares, que incluíam doenças cardíacas e acidentes vasculares cerebrais, num seguimento médio de oito anos, em comparação com aquelas que faziam as suas refeições durante um período de 12 a 16 horas. “A janela alimentar de oito horas foi associada a uma maior mortalidade cardiovascular na população em geral, bem como naqueles que tinham doenças cardiovasculares ou tumores pré-existentes”, diz a Dra. Marcella. A alimentação com restrição de tempo não pareceu afetar o risco de morte por todas as causas combinadas ou especificamente por câncer. “Mas em pessoas com câncer, ter uma janela alimentar de 16 horas, período em que se pode comer, foi associado a um menor risco de morrer de câncer”, diz a médica. Esse dado, inclusive, derruba o mito de que o jejum intermitente seria responsável por fazer as células boas destruírem as células cancerígenas.

Restringir o tempo de alimentação diária a um curto período, como oito horas, ganhou popularidade recentemente porque parece ajudar as pessoas a perder peso. Os autores esperavam que a adoção a longo prazo da alimentação com restrição de tempo de oito horas estaria associada a um menor risco de morte cardiovascular e até mesmo de morte por todas as causas. Mas eles ficaram surpresos ao descobrir que não era o caso.

No caso do câncer, os autores enfatizaram, no entanto, que as pessoas podem lutar contra a perda de apetite e, portanto, comer durante um período de tempo mais restrito. “Parte do que parece ser prejudicial pode ser devido às razões pelas quais as pessoas optam por comer desta forma”, explica a médica nutróloga. Mas mesmo entre as pessoas em geral que optaram por comer durante períodos de tempo restritos, não houve nenhum benefício cardiovascular claro. “Isso deixa em aberto a questão sobre se a alimentação com restrição de tempo pode melhorar a saúde cardiovascular no longo prazo”. Enquanto a pesquisa continua, as pessoas que procuram padrões alimentares mais saudáveis podem seguir dietas que comprovadamente melhoram a saúde do coração, como a DASH (Abordagens Dietéticas para Parar a Hipertensão) ou a dieta mediterrânea, ambas com pontuação mais alta para a saúde do coração de acordo com declaração científica da American Heart Association. “Pelo menos por enquanto, focar no que as pessoas comem é mais importante do que no horário em que comem. E, fundamentalmente, o jejum intermitente deve ser feito sempre com acompanhamento profissional”, diz a médica.

Segundo a Dra. Marcella, o jejum intermitente é uma estratégia dietética que não está indicada para todas as pessoas e os riscos aumentam muito quando o jejum é feito sem acompanhamento, pois as pessoas ficam longos intervalos sem comer e nos períodos que se alimentam o fazem de forma inadequada e isso pode causar alterações metabólicas como hipoglicemia, desnutrição, desidratação, sintomas como fraqueza muscular, dificuldades de concentração e ainda aumentar a tendência de desencadear transtornos alimentares como compulsão alimentar periódica, bulimia e anorexia. “Todos os tipos de jejum são contraindicados para gestantes, lactantes, crianças, adolescentes e alguns doentes crônicos”, diz a médica. “O melhor a fazer é sempre procurar acompanhamento médico nutrológico para a realização de jejum intermitente”, finaliza.

FONTE: DRA. MARCELLA GARCEZ: Médica Nutróloga, Mestre em Ciências da Saúde pela Escola de Medicina da PUCPR, Diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e Docente do Curso Nacional de Nutrologia da ABRAN. A médica é Membro da Câmara Técnica de Nutrologia do CRMPR, Coordenadora da Liga Acadêmica de Nutrologia do Paraná e Pesquisadora em Suplementos Alimentares no Serviço de Nutrologia do Hospital do Servidor Público de São Paulo. Além disso, é membro da Sociedade Brasileira de Medicina Estética e da Sociedade Brasileira para o Estudo do Envelhecimento. Instagram: @dra.marcellagarcez.

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