Segundo levantamento da PwC, o mercado e fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) bateu recorde no
primeiro semestre deste ano. Foram 807 transações lideradas pelo setor de tecnologia, número que ultrapassou os 706 negócios fechados no mesmo período de 2021. A perspectiva da PwC é que a tendência de crescimento continue nos próximos meses. Alguns fatores explicam essa aceleração. O primeiro é que, por conta da pandemia, as companhias tiveram que repensar seus negócios, serviços e produtos, e diversificar. Nesse sentido, os processos de M&A foram uma estratégia de competitividade e uma forma de acelerar o crescimento. “As empresas sempre buscam ganhar força e, para algumas, a consolidação por meio de fusões representa uma vantagem competitiva, pois é possível absorver conhecimento e serviços que já estão em atividade”, explica Ricardo Lacerda, CEO do BR Partners, banco especializado em assessoria financeira e investimentos.
O segundo ponto é a disponibilidade de liquidez no mercado – de acordo com a consultoria, tanto de fundos de investimento quanto de empresas com fluxo de caixa robusto, além da diversidade de players de sucesso no Brasil. Flávio Batel, sócio-fundador e CEO da Solstic, empresa especializada em operações de M&A, Valuation e Capital Advisory ressalta, ainda, que cancelamentos ou postergações de IPOs também abriram espaço para algumas companhias pensarem em fusão ou em venda de participação. Porém, apesar do alto volume, ele ressalta que os processos de tomada de decisão estão um pouco mais lentos, pois há muita discussão sobre o valor das negociações.
APOIO NA CAPTAÇÃO DE RECURSOS
Por outro lado, o mercado aquecido também traz oportunidades para quem atua diretamente nele. “Depois de analisar a fusão ou a venda do negócio, algumas empresas entendem que não é o melhor momento e começam a buscar auxílio para fazer a captação no mercado como alternativa para apoiar o financiamento do crescimento ou mesmo para uma reestruturação”, diz Batel. Segundo ele, isso tem sido um fator importante de crescimento na Solstic. Focada em negócios que faturam até R$ 500 milhões, a Solstic atende todos os setores da economia, com expertise no mercado de logística e tecnologia, e, em quase quatro anos de atuação, já movimentou R$ 1,5 bilhão em transações. Além disso, a empresa planeja voos mais altos e, por isso, deu início ao processo de criação de uma asset. “É um caminho natural do crescimento,” afirma Batel.
A BR Partners de Ricardo Lacerda seguiu esse caminho. Em 2009, a empresa iniciou como butique de fusões e aquisições e, no ano seguinte, com a entrada de um sócio e de uma equipe de 20 pessoas, levantou R$ 100 milhões de capital junto a famílias de alta renda no Brasil. Depois, entrou com um pedido no Banco Central e, em 2012, adquiriu a licença do antigo banco Porto Seguro. Em 2013, a empresa passou a atuar como banco de investimento, expandindo as atividades para a área de mercado de capitais e tesouraria. “Estamos em um segmento e em um momento muito positivo, o que possibilita crescimento e novas oportunidades. Em 2021, por exemplo, abrimos o capital na B3”, conta Lacerda, completando que, ao longo dos 12 anos de atuação, o crescimento da BR Partners tem sido de 30% por ano com rentabilidade acima de 25%.
DENTRO DA LEI E COM PREÇOS JUSTOS
Embora estejam em ótima fase, é preciso considerar que os processos de fusão e aquisição envolvem aspectos legais que não devem ser desprezados. Quem faz essa ponderação é o advogado Marcelo Salomão, sócio-presidente do escritório Brasil Salomão e Matthes, que atua em São Paulo e em outros estados brasileiros, e também tem operação em Portugal. Aqui, o advogado elenca algumas questões legais que precisam ser consideradas:
– due dilligence – Trata-se de um procedimento que investiga e analisa os riscos de uma empresa. Segundo Salomão, o objetivo é fazer um exame minucioso de possíveis riscos financeiros, fiscais e jurídicos. Nesses últimos estão abrangidos, inclusive, questões trabalhistas, ambientais e até tecnológicas. “É um olhar atento e profundo para todos os fatores que compõem a operação de aquisição de uma empresa. Quanto mais profunda e detalhista for essa análise, melhor”, explica o advogado, que completa o raciocínio citando alguns exemplos: na área tributária não basta dizer que existem ações discutindo a incidência de ICMS, PIS e Cofins, para citar três tributos que geram discussões enormes no Judiciário. “É fundamental saber sobre a fase do processo, os argumentos utilizados e como está a jurisprudência do tema. Não é porque há uma ação do Fisco exigindo tributo que devemos considerar esse imposto devido. Assim como não se pode ignorar a existência de ações em que a empresa esteja na condição de autora, pleiteando o não pagamento ou a restituição/compensação de um tributo. No Brasil, tanto quanto a lei, é fundamental fazer a due dilligence, levando em conta a posição do STJ e do STF.” De acordo com Salomão, o pilar tributário é essencial para a segurança e a transparência do negócio, facilitando a correta definição do preço.
– análise para minimizar o ganho de capital – Ainda no âmbito tributário, mas em conjunto com o societário, Salomão destaca que um trabalho diário de seu time de M&A é buscar a melhor solução para a entrada de capital para os sócios. A preocupação é com o custo tributário incidente sobre o resultado positivo entre o valor de venda da participação societária e o valor de quando o sócio entrou na empresa. Para esclarecer esse ponto, o advogado cita a seguinte situação: “Imagine que uma empresa valia R$ 5 milhões quando a pessoa entrou em seu quadro societário e que, no momento de sua saída, tenha sido avaliada em R$ 150 milhões. Nesse caso, há inequívoco ganho de capital”. Por isso, Salomão ressalta a importância do planejamento para esse tipo de operação. “É completamente diferente quando somos contratados com antecedência, podendo trabalhar preventivamente e lado a lado com as demais assessorias envolvidas na compra ou na venda de uma empresa. Para esse caso que mencionei, existem algumas soluções absolutamente legais. Uma delas, por exemplo, é a criação de uma holding, em que a participação societária da pessoa física seria aportada e a venda futura envolveria o patrimônio da holding ou ela própria”, finaliza.
– recuperação de créditos – O escritório de Salomão criou uma área específica para atender operações de M&A que tem gerado grande diferencial para seus clientes, qual seja a área de recuperação e levantamento de créditos tributários. “A complexidade de nosso sistema tributário, somada a este momento de crise financeira e política, impede que os contribuintes tenham conhecimento de créditos tributários não aproveitados, bem como de tributos cobrados inconstitucionalmente.” Salomão diz que é fundamental que esse levantamento seja feito com lupa, pois não é raro que a empresa se descubra credora de alguns milhões, o que influenciará diretamente no preço da operação.
O que movimenta o setor
Aqui, as principais motivações das operações de fusão e aquisição e as tendências e perspectivas da área.Do lado do vendedor
– aceleração do crescimento
– captação de recursos
– viabilização de projetos de expansão
– realização de investimentos dos sócios
– dificuldades financeiras
– disputas societáriasDo lado do investidor
– aceleração do crescimento
– aumento do portfólio de produtos e serviços
– alternativa de investimento
– eliminação de concorrente
– necessidade de novas tecnologias
– entrada em novos mercadosOs obstáculos
Os desafios para esse mercado envolvem, principalmente, o aumento da inflação globalmente e a redução de margens operacionais, o aumento das taxas de juros dos países, o que eleva o custo de capital e o crescimento de dificuldades de supply chain, como os gerados pela guerra na Ucrânia e as tensões geopolíticas entre os Estados Unidos e a China.O que está em alta
Negócios com ações voltadas à preservação ambiental, ao desenvolvimento social e à governança corporativa, o chamado ESG, têm recebido muita atenção de empresas e investidores dos setores de EU&R nos últimos anos.Perspectivas até o final de 2022
Segundo um levantamento feito pela Bain & Company, o mercado de fusões e aquisições pode movimentar US$ 4,7 trilhões até o final de 2022. Se isso realmente acontecer, será o segundo melhor ano para negociações já registrado.
“Depois de analisar a fusão ou a venda do negócio, algumas empresas entendem que não é o melhor momento e começam a buscar auxílio para fazer a captação no mercado como alternativa para apoiar o financiamento do crescimento ou mesmo para uma reestruturação.”
Flávio Batel, fundador e CEO Solstic
“Para algumas empresas, a consolidação por meio de fusões representa uma vantagem competitiva, pois permite que elas absorvam conhecimento e serviços
que já estão em atividade”
Ricardo Lacerda, CEO BR Partners
“Embora estejam em ótima fase, os processos de fusão e aquisição envolvem aspectos legais que não podem ser desprezados. Dentre eles, due dilligence, análise para minimizar o ganho de capital e recuperação de créditos tributários”
Marcelo Salomão, sócio-presidente Brasil Salomão e Matthes Advocacia