Em seu primeiro mandato como deputado federal, Marcelo Ramos (PL-AM) circula com desenvoltura pelas várias alas da Câmara. Tem boa interlocução com a esquerda e ganhou musculatura num partido de centro-direita. Sua versatilidade é tamanha que planejou candidatar-se à presidência da Casa com as bênçãos de Rodrigo Maia (DEM-RJ), mas acabou por se aliar ao favorito, Arthur Lira (PP-AL), e elegeu-se para a nova Mesa Diretora como 1º vice-presidente.
Capacidade de articulação, diálogo e busca de pacificação dos polos opostos são características de sua atuação. Mas, assim como com tantos outros parlamentares, fidelidade partidária não é exatamente o forte do deputado. Ele foi vereador em Manaus pelo PCdoB e deputado estadual no Amazonas pelo PSB antes de aderir ao PL, do eterno Waldemar Costa Neto.
Presidente da Comissão da Reforma Administrativa que apreciou a proposta do Executivo, Ramos repete o discurso de Rodrigo Maia de que é hora de se concentrar no combate à pandemia e nos projetos para a retomada da economia. Mas não se furta a prever que a onda bolsonarista não se repete em 2022.
O deputado falou com Poder Online.
PODER Online – Que balanço faz de seus primeiros meses como 1º vice-presidente da Câmara?
Marcelo Ramos – As atividades estão bastante comprometidas por conta das restrições da pandemia, e houve consumo de energia com o caso Daniel Silveira (PSL-RJ), mas considero que conseguimos avançar em algumas pautas importantes como a autonomia do Banco Central, a PEC Emergencial, a MP para a compra das vacinas, a MP da energia no Amapá, Amazonas e Pará. Portanto, faço um balanço positivo. Procuro contribuir com a pauta do país e ajudar o presidente Arthur Lira a dirigir os trabalhos da Casa.
PODER Online – O senhor é próximo de Rodrigo Maia e agora está na Mesa Diretora, com Arthur Lira. Quais as diferenças entre eles?
Marcelo Ramos – O presidente Rodrigo Maia foi fundamental num momento em que era necessário estabelecer limites a uma sanha autoritária de setores do governo e da sociedade. Penso que o presidente Lira reafirma a independência da Casa. O discurso [do sinal amarelo e dos remédios amargos] que fez nos últimos dias é prova disso, restabelece uma relação de harmonia com o Executivo, o que é bom para o país.
PODER Online – Como ficou sua relação com Maia, após se lançar candidato pelo bloco de Lira?
Marcelo Ramos – Antes de tomar a minha decisão tive uma conversa com o ex-presidente e ele também foi o primeiro a saber da minha decisão de acompanhar o meu partido e compor com Arthur. Na política, quando se trata com verdade e lealdade, as relações se mantêm. Mantenho uma relação fraterna com o deputado Rodrigo Maia.
PODER Online – Uma parte relevante do Congresso se elegeu com o apoio de Bolsonaro. Nas eleições de 2022, como deve ficar esse cenário?
Marcelo Ramos – Penso que o presidente Bolsonaro será um candidato competitivo, mas não será o fenômeno de 2018, que elegeu com ele algumas figuras sem nenhuma experiência política pelo simples fato de se alinharem ao bolsonarismo ou carregarem o número 17. Esse fenômeno não ocorrerá em 2022, e todos terão que prestar contas de seus mandatos.
PODER Online – O senhor se apresenta como um parlamentar independente do Centrão. Qual o perfil do bloco hoje?
Marcelo Ramos – Acho que falta um centro político moderado no nosso país. Um programa de centro moderado. As pessoas que não se identificam com os extremos não tem um programa para se unir. Acaba que o que se chama de centro no Brasil é um grupo que dá governabilidade aos governos que se alternam. Eu sou um moderado, liberal na economia e não sou conservador nos costumes – acima de tudo uma democrata que defende de forma intransigente os valores da democracia.
PODER Online – Em sua avaliação, quais são os erros e acertos do Executivo na condução dos trabalhos para conter a pandemia?
Marcelo Ramos – A negação da gravidade da pandemia e das orientações da OMS são os maiores erros, todos os outros são decorrentes desses. Registraria como acerto o volume de recursos para o combate à Covid disponibilizados ano passado.
PODER Online – Como a Mesa Diretora, hoje alinhada com o palácio do Planalto, receberia um eventual pedido de impeachment de Bolsonaro?
Marcelo Ramos – Impeachment não é tema que se discuta em tese, mais ainda em meio a uma pandemia com a dramaticidade sanitária, econômica e social que se abate sobre o Brasil. Vamos unir esforços para fazer todos os brasileiros respirarem, depois apuramos responsabilidades.
PODER Online – Qual a análise que o sr. faz sobre a reforma ministerial?
Marcelo Ramos – Temos que esperar o conjunto das mudanças para uma análise mais acertada. No ministério das Relações Exteriores acredito que não exista nada pior do que o que tínhamos, na dança de cadeiras dos militares penso que se perde uma voz mais independente na Defesa e, com um político na secretaria de Governo, se tiver autoridade para o exercício da função, pode melhorar a relação com o Congresso.
PODER Online – Qual a expectativa em relação às reformas administrativa e tributária?
Marcelo Ramos – A reforma administrativa deve caminhar com alguma celeridade. Apesar de só atingir novos servidores, ela será um sinal de compromisso de longo prazo com o equilíbrio fiscal e isso é importante para a política de juros e para os investidores. Quanto à tributária, sou bastante cético, penso que é muito difícil chegar a um mínimo de convergência setorial e federativa para aprovar uma PEC [proposta de emenda constitucional].
Propus um pacto tributário nacional que resumo em quatro itens: lei nacional do ICMS e do ISS; marco regulatório das políticas de desenvolvimento regional e setorial; mutirão tributário no STF, com decisões colegiadas de mérito nos maiores contenciosos tributários do país; e Receita Federal ciente do seu dever de respeito às decisões legislativas e judiciais.
PODER Online – Qual a possibilidade de aprovação da lei nacional do ICMS neste ano, uma de suas bandeiras?
Marcelo Ramos – Se ficar claro que não teremos ambiente pra aprovação de uma PEC de Reforma Tributária, pode ser que ganhe força a ideia dessa lei. No ICMS está concentrado o maior contencioso tributário do país, uma lei nacional teria um impacto enorme no ambiente de negócios.