Revista Poder

“Perdi o útero por trabalhar para este governo maluco”

Deputada federal mais votada em 2018, Joice Hasselmann (PSL-SP) fala em entrevista exclusiva a Poder Online sobre ter virado vidraça, os erros do PSL e sobre a sororidade acima de ideologias que conheceu em Brasília

Joice Hasselmann || Crédito: Maryanna Oliveira/Câmara dos Deputados

A deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) foi eleita em 2018 para seu primeiro mandato parlamentar com perto de 1,1 milhão de votos, embalada por incansável e implacável pregação antipetista, que desde 2015, ainda antes do impeachment de Dilma Rousseff, vinha encontrando eco no país.

A antes jornalista paranaense foi a deputada federal mais votada da história e cacifou-se como líder do governo com a vitória presidencial de Jair Bolsonaro, que concorreu por seu partido.

Dois anos depois, candidata à prefeitura paulistana, amargou 98 mil votos, ficando muito longe do segundo turno, disputado por Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (Psol). Entre essas duas eleições ela teve papel protagonista no parlamento, tanto no apoio ao governo como na oposição a ele.

Ao romper com Bolsonaro e seus acólitos, Joice começou a experimentar algo que conhecia bem, a artilharia virtual. Ao virar vidraça, as pedras que recebia envolviam machismo e gordofobia, cortesia principalmente do colega de bancada Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o 03.

Hoje, tendo aprendido a conviver com pessoas de partidos que ela um dia abominou – mantém uma espécie de confraria feminina que contempla deputadas do PT e do PCdoB -, muito mais magra após reeducação alimentar e ainda crítica severa de Bolsonaro, ela concedeu esta entrevista a Poder Online.

PODER Online – Como viu as novas presidências das comissões da Câmara?

Joice Hasselmann – O que destoa é justamente as integrantes do meu partido, né? Esse pessoal de uma direita extremista, absolutamente negacionista e nada inteligente, que repete asneiras como se fossem vaquinhas de presépio do inepto presidente da República. É uma vergonha. As três pessoas que estão em comissões só estão lá em razão  do acordo político feito em troca da presidência da Câmara.

PODER Online – Como avalia o fato de sua ala do PSL ter perdido comissões para PSDB e DEM?

JH- Se fosse uma eleição com base em regimento e meritocracia, não teríamos pessoas como Bia Kicis (PSL-DF) ou Carla Zambelli (PSL-SP) comandando comissões. É uma chacota internacional. Já imaginou quando forem discutir Amazônia? Ou questões de constitucionalidade, tendo uma presidente da CCJ [Kicis] que já defendeu o AI-5? É uma loucura, né? Uma deputada que esteve em manifestações golpistas contra o Supremo. Então, não dá. Mas a vergonha não é para mim. Critico meu partido por não ter feito nada.

Poder Online – Houve uma discussão sua com o presidente do partido, Luciano Bivar, via WhatsApp. O que aconteceu?

JH – Para mim, é uma humilhação o que essa gente faz subindo na tribuna, xingando o PSL dia e noite nas redes, achincalhando o partido. E aí, o PSL dobra a espinha até mostrar os fundilhos para esse bando de trombadinhas. O partido foi absolutamente frouxo na condução da coisa. A escória não pode ser premiada com comissão, com liderança. Foi por isso a minha discussão com o presidente Bivar.

PODER Online – Como se sente, sem cargo?

JH – Essa historia é uma grande bobagem. Fui líder do governo, deixei a liderança do governo, liderei o partido,  deixei a liderança do partido, fui para a Secom [secretaria de Comunicação]. Tinha avisado ano passado a todos, inclusive aos candidatos à presidência da Câmara, que eu não queria cargo nenhum. Porque foram anos focada em organizar o partido e esse governo esquizofrênico, e acabei tendo menos tempo para me dedicar às minhas bases, em São Paulo.

PODER Online – Isso refletiu na sua votação nas eleições municipais.

JH – Paguei três contas em uma eleição só. A conta das pessoas que me culpam até hoje por ter sido a primeira mulher com expressão nacional a pegar pela mão o Bolsonaro e sair fazendo campanha. Fiz isso, e até me culpo. A dos bolsonaristas fanáticos, que me culpam por ter rompido com o louco. E a dos que perguntam: ‘você é o quê?’ Porque sou anti-Bolsonaro e sou anti-PT,  sou anti-Bolsolula.
Some-se a isso uma eleição atípica, praticamente um plebiscito. Na pandemia, todos estavam com muito medo de arriscar.

PODER Online – Quais seus projetos e prioridades em 2021?

JH – Foco em São Paulo e na construção de um projeto Brasil 2022, para o qual reúno nomes já há algum tempo. Não interessa o candidato, mas tem de ser de uma direita centrada, um candidato que respeite as diferenças, que defenda a economia liberal, a redução de estado. Você estimular ainda mais o radicalismo, o “nós e eles”, como fez o PT, e que piorou muito com Bolsonaro, é nefasto. Esse extremismo, essa polarização fez muito mal ao Brasil.

PODER Online – Sua vida pessoal ganhou destaque, especialmente pelo novo visual. Que cuidados tomou em meio à correria da política? 

JH – Quando me envolve, tudo vira notícia. É impressionante. Seu estou gorda, vira notícia. Se eu emagreço, vira notícia. Eu decidi cuidar da minha saúde depois de um piripaque, em que parei na UTI. Perdi meu útero. Meu corpo absorveu toda aquela pressão, os sapos que engoli enquanto trabalhava para este governo maluco. Carreguei muita coisa nas costas em troca da aprovação da reforma da Previdência.

Tem gente que acha que [o novo shape] foi do dia para noite, mas foi um ano de trabalho, de reeducação alimentar. Então, comecei a dividir com as pessoas. Muitas mulheres passaram por coisas semelhantes às que eu passei, gente me achincalhando nas redes por estar acima do peso, e muitas mulheres dividiram comigo a dor de viver isso dentro de casa, com os próprios maridos cobrando porque engordaram alguns quilos. Ao dividir minha experiência, a mulherada formou um clube. Criei um Instagram só para isso, @bemestarcomJoice.

PODER Online: Hoje você tomaria café com a oposição?

JH – Eu separo muito a questão ideológica da vida pessoal. Há uma confraria de mulheres parlamentares que se reúne na minha casa, e essa confraria é de todos os espectros ideológicos. Tem PCdoB, PT, PP, PSDB. A gente vem aqui pra casa e fala da pauta Brasil, da pauta feminina. Eu brinco que quando chegamos em casa, a gente deixa pra fora duas coisas: o sapato, para não trazer sujeira e coronavírus, e  o partido. Aprendi isso aqui em Brasília, não tinha essa maturidade quando fui eleita, de conseguir separar as coisas.

Gosto de cozinhar, faço um jantar aqui, e elas adoram. Improviso uma massa, rapidinho, faço alguma coisa e ficamos aqui. É algo muito maduro. Tenho orgulho desse bom relacionamento.

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